Friday, January 31, 2014

Uma longa e interminável novela

Uma longa e interminável novela



O Cássio, não sei se é político ou não, disse que está “passando por vilão”.  Estou sem contexto, não sei se é verdade, se é justo ou certo, mas está lá nas notícias. Estão falando de um tal de paredão, espero que os tempos de revoluções sangrentas tenham passado. Paz e amor, por favor. Parece também que um avião foi desviado para Lisboa. Não desviam mais aviões para Cuba? Não estou entendendo. Parece que incendiaram um fusca e a Mariah foi encontrada morta. Assassinato? Crime? Será que estou misturando as notícias? Parece que vão dar um jeito para a Portuguesa, com certeza. Ou vão dar um jeito “na” Portuguesa? Estou certo de que esta história não tem nada a ver com o avião de Lisboa – embora ambas, de certa forma, estejam relacionadas com a mãe lusitana -  e nem com aquela do piloto que pousou no aeroporto errado nos Estados Unidos. Na nossa pátria amada, querida, cheia de encantos mil, não se pousam aviões, assim, em qualquer lugar. Onde se viu?
Eu confesso, às vezes fico confuso. Tanta notícia esquisita e, por cima, eles ainda misturam tudo na mesma página: política, novela, reality show, esportes e até justiça. Esportiva, criminal ou comum? Ou é só mais uma injustiça?  É só a gente ficar um pouco fora do país que não consegue entender mais nada.

Ou será que é assim mesmo? Tudo não passa de uma grande, longa, interminável e repetitiva novela?

Thursday, January 30, 2014

Boa vizinhança

Boa vizinhança



O sr. Williams gostava de morar ali. Viúvo e aposentado, já com uma certa idade, não queria saber de confusão, de barulho, de gente tocando a campainha. Seus vizinhos, então, eram perfeitos. O casal Carter não poderia ser melhor. O marido saía só de vez em quando, fazia alguma coisa na frente da casa e entrava de novo. Se visse o Williams, falava um “Hi”, um bom dia, uma boa tarde. A sra. Williams, saía menos ainda. Como o marido, sempre sorria e cumprimentava. Eram, ao todo, três cabeças brancas, cumprindo a última etapa da vida, sem maiores compromissos. Não queriam aborrecimento de ninguém e não queriam aborrecer ninguém. Perfeito para o sr. Williams: cada um cuidando da sua própria vida.
Houve uma época, porém, em que a sra. Carter era pouco vista. Certamente não estava se sentindo bem e evitava sair. Umas duas vezes o Williams chegou a ver uma cabecinha branca de mulher entrando de volta na casa. Mas não poderia garantir se era ela. Estava um pouco diferente. Podia ser uma irmã, uma parenta. Talvez, um dia, pudesse perguntar ao sr. Carter, mas tinha medo de incomodar. Por outro lado também temia que ele começasse a conversar muito e a coisa pudesse evoluir. Queria sossego e deixou um tempo passar.
Um dia, ao voltar de uma de suas andanças – precisava não enferrujar – viu que seu vizinho Carter estava descarregando uns móveis. Talvez estivesse cansado dos velhos. Foi tudo muito rápido e o caminhão partiu. Nos dias seguintes, o sr. Carter continuou cumprimentando-o como sempre. Parecia,  no entanto, mais jovial, mais alegre. Talvez agora fosse uma época boa  para perguntar sobre a  sra. Carter. De passagem, é claro, sem prolongar o diálogo. Ele e seu vizinho tinham mais o que fazer. Talvez pudesse aproveitar e perguntar quais eram seus primeiros nomes. Afinal de contas moravam perto há anos e só sabia seu sobrenome.
Não precisou. Num dia bonito de sol, enquanto preparava-se para sua caminhada matinal, o sr. Williams  ouviu a campainha tocar. Que ousadia, quem se atrevia a atrapalhar a sua rotina? Abriu a porta com cara de poucos amigos e lá estava o sorridente Carter com um envelope na mão. O carteiro, por engano, havia deixado a correspondência em sua casa e ele estava devolvendo. Muito obrigado. O senhor é muito gentil. Sempre estou para perguntar, qual é mesmo seu primeiro nome? Jeff, Mark, Bob, Tom? Assim foi a conversa. Tinha de ser prático, eficiente e , principalmente, rápido. Afinal depois de tantos anos...
Foi aí que o Carter retrucou que não, só estava ali há algumas semanas. Seu irmão gêmeo,  o outro Carter, havia falecido, ele não sabia? Ele não era o Carter que ele pensava.Como poderia, eles eram idênticos! A casa estava vazia e ele morava lá para o Norte – um frio desgraçado – resolvera se mudar e ocupar a casa fraterna. Antes que ele perguntasse, o Carter irmão explicou que a sra. Carter – cunhada - havia falecido também, há uns três anos, e foi uma questão de tempo, o marido também ir para outro lado. Não é assim que sempre acontece, homem viúvo não dura muito tempo?
Foi um vexame não saber o que estava acontecendo com os vizinhos nos últimos três anos. Mas o sr. Williams não ficou envergonhado. A sra. Carter morreu, o sr. Carter mudou para o outro lado da existência também, e o irmão Carter, outro Carter, mudou-se para um lugar mais quente. Foi isso que aconteceu, como ele poderia adivinhar? Que  lugar agitado, quem aguenta um movimento desses? Tudo isso acontecendo ali, bem ao lado, e o sr. Williams não sabia de nada. Para ele, sempre estiveram ali o sr. e a sra. Carter, sorridentes, cabelos alvos, bom dia, boa tarde, vou bem, obrigado.

Ainda bem que o sr. Williams não percebeu. Se tivesse, a rotina dos seus últimos três anos estaria completamente arruinada. Vizinhança boa, essa, não é o que o sr. Williams sempre fala?

Tuesday, January 28, 2014

Anoitecer: pena de nós

Anoitecer: pena de nós



Quando anoitece, nossas almas começam a se recolher. Refletem sobre o dia que passou, sobre a noite que vem. Cansadas da labuta, esperam o descanso. Temem, porém, os pesadelos que podem vir. Temem as sombras. Esperança misturada com receio, um pequeno paradoxo.
É o ciclo da existência, esse ir e vir, essa eterna disputa entre a necessidade da luta e a ansiedade pela paz. A alma guerreira querendo descansar. O soldado com medo de baixar a guarda na solitude e na escuridão da noite.
A transição é lenta. Conforme as luzes vão se esvaindo, porém, o espírito vai se aquietando. É hora de se acomodar, de meditar. Sombras e luz, paz e guerra, trabalho e descanso, eternas dicotomias do homem.

Mas, na verdade, mesmo, desconfio que o anoitecer é simplesmente quando  sentimos pena de nós mesmos...

Monday, January 27, 2014

Um sorriso

Um sorriso

Parece tão simples, um sorriso. Certamente indica felicidade, comoção, cumplicidade. No entanto, caro leitor, é muito mais que isso, ou pelo menos pode ser. Num sorriso podem estar escondidos mistérios e maravilhas sequer imaginadas.
Há uma multitude de pequenos sinais, de movimentação de músculos. Há a graduação de intensidade de abertura dos lábios. Há o acompanhamento do olhar, combinado com o que a boca quer dizer. Pode haver histórias, escondidas ou não, no sorrir. Às vezes, pode-se ver o que o outro está pensando quando se sorri. Até a alma, às vezes, pode-se ver. Pode haver compreensão misturada com alegria, cumplicidade com alívio, exultação com realização, comprometimento com felicidade. Há, ainda outras infinitas combinações.
O sorriso é a coisa mais linda que existe entre as expressões do ser humano e, é claro, exclusividade nossa. Pode mudar nosso momento, nosso dia e, em alguns casos, toda uma vida. Joia rara, preciosa, e para a qual não se pode dar um preço.

Infelizmente existem também os sorrisos maliciosos, os malvados, e o pior de todos, o falso. Desses todos, porém, não quero falar. Não no dia de hoje, pois hoje é dia do sorriso, acabei de inventar...

Thursday, January 23, 2014

Arrastão, rolezinho e BBB

Arrastão, rolezinho e BBB



Não quero ser saudosista, mas naquela época, nos anos 60, “Arrastão” era apenas uma composição espetacular de Edu Lobo e Vinícius de Moraes. Claro, era também um tipo de pesca. So décadas depois foi acrescentado o sentido figurado de “grupo de pessoas que passa por um lugar levando carteiras, dinheiro, joias dos incrédulos frequentadores do mesmo”.
Tenho alguns alunos americanos que estão aprendendo Português, agora que nosso país está tendo um “boom” econômico e que vamos ter a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Sempre lhes recomendo ler os jornais brasileiros na Internet para depois discutirmos o assunto. Todo mundo sabe que é importante para quem aprende uma língua, também conhecer sua cultura. Obviamente eles se depararam com a palavra “arrastão” e, infelizmente não foi a gravação majestosa que a Elis Regina fez naquela época. Expliquei para eles, com detalhes, o que era o “arrastão” de hoje em dia. Claro que eles entenderam. Entenderam mas não compreenderam. Ficaram com aquele olhar vago, distante, como quem pergunta “Existe mesmo?”, “É isso mesmo que eu ouvi?”.
Agora, eu mesmo estou tentando entender o que significa “rolezinho”.  Acho que quase entendi, mas faltam alguns detalhes. Espero que, quando eles me perguntarem, eu possa fazer uma pequena dissertação. Essa língua continua sempre evoluindo, não é mesmo? Tempos modernos...
Outro termo que já existe há algum tempo é o tal de “BBB”. Esse eu nunca tentei entender, mas foi de propósito, acho que, bem lá no fundo, não quero saber. Não é crítica à cultura brasileira, não. Afinal de contas esse país daqui – o do Norte - é o rei dos “reality shows”. Essa resistência de entrar no fundo do significado do tal de “BBB” é uma idiossincrasia, não consigo...Se quisesse, era só ir online e tudo ficaria esclarecido.
Existe o outro lado da moeda. Quando pergunto para os americanos o porquê desse amor incondicional por armas pesadas e seu vínculo com aqueles “shootings” insensatos, eles me explicam que está na Constituição Americana. É o direito inalienável de portar armas, argumentam eles. Mesmo você insistindo que são essas mesmas armas que matam crianças e outros inocentes, eles explicam que... Não importa, como eles, em relação a nós, eu entendo, mas não compreendo. Devo ficar com aquele mesmo olhar vago de alguém que vive em outro mundo.

E assim são as coisas. Nenhum país é perfeito. Ou ainda, como se diz por aí, cada país tem a diversão que merece...

Wednesday, January 22, 2014

As brigas do vovô e da vovó


As brigas do vovô e da vovó

Ele ficava sentado, ali ao lado dela, enquanto ela fazia tricô. Falavam sobre coisas banais ao mesmo tempo em que ele, ali, da varanda,  olhava a paisagem. Em certo momento, ele arriscava:
- Você vai ficar tricotando o dia inteiro?
O toque de irritação era quase imperceptível. Aliás, não para ela, que o conhecia há muitos e muitos anos. Delicadamente, quase com suavidade, ela respondia:
- Vou sim, meu amor! Você acha que eu posso?
Diante da sutil ironia, ele se levantava  e ia até o quarto. Mexia em algumas coisas, aqui e ali. Depois caminhava até a cozinha e bebia um copo de água. Voltava, então, para a varanda. Sentava-se e passava as mãos nos cabelos brancos da esposa. Daí, falava:
-Está tudo bem, meu amor?
Com muito carinho, ela respondia:
-Está, sim, querido, está tudo melhor agora.
Daí, eles conversavam novamente sobre coisas distantes, sobre os netos, sobre tudo. Riso, silêncio, riso de novo...
Assim eram as brigas do Emílio e da Maria, o vovô e a vovó...


Monday, January 20, 2014

Uma bandeira, em um certo lugar

Uma bandeira, em um certo lugar

Vi na TV a equipe de reportagem insinuando-se entre os arbustos até chegar a uma clareira. Lá estavam  quatro ou cinco pessoas, mal vestidas, tentando se proteger do terrível frio que está assolando algumas áreas dos Estados Unidos. Rostos sofridos, visivelmente abatidos com as intempéries. A repórter explica que são veteranos de guerra: Iraque, Afeganistão e até Vietnã. No fundo, uma barraca, que, certamente não os protege das baixíssimas temperaturas. Numa árvore, pendurados, utensílios de cozinha; frigideiras, panelas. Um velho  retrovisor de carro está amarrado a um dos galhos e serve como espelho.
Provavelmente a guerra que eles lutaram não foi justa. Eles, entretando, nada decidiram, não foi sua escolha. Tiveram que ir, eram soldados, arriscaram suas vidas por uma nação, independentemente das razões absurdas que os dirigentes usaram para lançar o conflito. Se são heróis, como estão, assim, abandonados, quase como mendigos, com risco de morte, por causa do frio? É difícil entender.

Alguém  resolveu socorrê-los, dar-lhes abrigo. O repórter fotográfico mostra aqueles veteranos entrando, com dificuldade, no veículo que veio buscá-los. E a imagem do lugar começa a ficar para trás. Entretanto, antes de sair, focaliza a bandeira americana, surrada, pendurada de um dos arbustos. Orgulho? Patriotismo? Talvez devêssemos aprender algumas coisas com eles? Não sei. Aquele símbolo, naquelas circunstâncias e principalmente apesar delas, definitivamente me chocou e me emocionou...

Sunday, January 19, 2014

Um amor quase verdadeiro

Um amor quase verdadeiro


Selena olhava cartas antigas, cuidadosamente guardadas em uma caixa de madeira. De repente se deparou com uma que tinha recebido de Leonardo logo depois de abandonar Colina Alta, sua cidade natal. Ela tinha rompido o namoro de mais de 6 anos. Ele continuou tentando, por muito tempo, reconquistar seu coração. Na verdade ela não desgostava dele, apenas queria conhecer melhor o mundo, ter novas experiências. O fato é que se deu mal. Após vários casos com homens de tipos bem diferentes, só  teve desilusão, traição, e dor. Ao ler aquela declaração de amor novamente, seu coração ficou tocado e, quase imediatamente, resolveu voltar para Colina Alta. Ela sabia que ele nunca tinha saído de lá. Quem sabe? Antes, porém, leu e releu a velha missiva:

“Amada Selena:
Colina Alta, 19 de setembro de 1992

Nem sequer guardo rancor por causa de sua partida. Amor é assim. Sem vingança, sem mágoa, sem ressentimento. Se assim não fosse, não teria sido amor, teria sido, sim, amor próprio. Vá viver sua vida e se encha de felicidade. Que seus sonhos, pequenos e grandes, se tornem uma viva realidade. Vá com cuidado, porém, a vida é cheia de perigos, cheia de armadilhas. E nem todos são como eu. Não se deixe enganar por um falso amor. Lembre-se que paixão e carne não são o mesmo que amor verdadeiro. Eu sei que você é esperta mas, mesmo assim,  me preocupo. Tanto engano existe por aí, meu amor, meu ex-amor, que é difícil não se deparar com eles. Esteja preparada.
Olhe bem fundo nos olhos de quem lhe jurar amor. Bem fundo. Se você conseguir ver o que viu nos meus olhos, amor será. Mas duvido que isso vá acontecer, pois, igual ao meu, nunca você vai encontrar.
Se um dia, desanimada da vida, você descobrir que só falsidade tem acompanhado seus dias, pode voltar. Eu sempre amei você e sempre vou amar. Estarei esperando...Pode voltar, querida!
Leonardo, aquele que sempre a amou e que sempre vai amá-la!”      

Quase chorou. Ele, o coitado do Leonardo, deve ter sofrido. Sabia que ele tinha um grande coração.
Colocou um  pouco de roupas numa maleta, pegou o ônibus e se foi. Procurou sua velha amiga na pequena cidade e se hospedou lá. Não tinha falado com ela sobre  a verdadeira razão da viagem. Disse apenas que gostaria de recordar os velhos tempos. Depois de ser recebida, tomar um banho e apreciar um bom almoço, ambas sentaram-se na varanda. Foi aí que mostrou a carta e confessou para  a amiga o verdadeiro objetivo de sua presença. Enumerou, também, todos seus frustrados relacionamentos. A amiga suspirou, segurou suas mãos e disse:
-Sinto muito por você, Selena. Mas tenho de aconselhar. Nem tente. Ele está casado, tem dois filhos lindos, e adora a esposa. Todo mundo tem inveja do casamento deles. Sem chance.
Selena olhou desiludida para o céu lindo que se desvendava diante delas e exclamou:
-Droga! Droga de vida!
Depois de algum tempo, abraçou a amiga, chorou um pouco e foram passear. Dois dias depois, arrumou suas coisas e voltou. Afinal de contas, o amor de Leonardo não era tão verdadeiro assim, pensou. Traidor! Ou talvez ele fosse do tipo que gostava de amar, não importava a quem?
Agora era sua vez de ficar desiludida. “Estarei esperando...Pode voltar, querida!”... Conversa fiada...
Corações humanos, quem consegue entendê-los?



Friday, January 17, 2014

A verdadeira selva

A verdadeira selva

(O técnico da Suíça disse que vai ter de jogar "no meio da selva".)



O técnico da Suíça, Ottmar Hitzfeld, reclamou da tabela da Copa do Mundo no Brasil, por programar para Manaus um dos jogos de seu país. Em uma reportagem,  ele fala que é um absurdo jogar com 95 por cento de umidade e uma temperatura entre 30 e 40 graus. Não poupou críticas também  à partida programada para Salvador que também tem temperaturas altíssimas. Reclamou dos longos voos entre as cidades, reclamou, reclamou.
Times de São Paulo e Rio tiveram de jogar, muitas vezes, na Bolívia, pela Libertadores da América, naquela altitude desgraçada onde o ar praticamente desaparece.  Podemos dizer que estavam numa selva dos píncaros. Precisaram fazer jogos em que os juízes praticamente pareciam contratados pelo outro time. Nunca fizemos queixas desse tipo.
Voltando ao técnico europeu, ele se declarou irritado por ter de jogar “no meio da selva”. Na verdade eu acho que ele é muito enjoado. Em primeiro lugar, ele que se classifique melhor da próxima vez, para poder jogar num lugar menos distante.  Em segundo lugar, eu acho que ele é ingênuo.  Já nos anos setenta havia uma novela chamada “Selva de Pedra”,  que se referia a São Paulo. Acho muito mais arriscado do que a outra selva à que ele se refere.  E mais, ele que não fique para a final no Rio de Janeiro. Aí é que ele vai ver o que é selva... Melhor ficar o tempo todo no hotel para não ser “caçado” na selvagem floresta carioca. Comparada com nossas metrópoles, Manaus vai parecer um lindo bosque, cheio de flores e paisagens gentis.

Coitado, ele não tem a menor ideia do que significa “selva” aqui para nós. Pensando bem, ele não é arrogante, é definitivamente, ingênuo.

A notícia

Thursday, January 16, 2014

Pousando em estranhas pistas

Pousando em estranhas pistas



Estão falando bastante do avião da Southwest que desceu no aeroporto errado há uns dias atrás.  O engano foi de onze quilômetros, o que não é muito, se considerarmos este vasto mundo de Deus e a imensidão do firmamento. Mas ninguém perdoa essas coisas, estão em cima do coitado do piloto. Será que, como num caso anterior, ele estava atualizando seu perfil no Facebook? Eu prefiro colocar a culpa nos computadores. São metidos, sabem de tudo, e acharam que a nova opção seria melhor. De qualquer jeito, isso é coisa séria, vai sobrar para o coitado.
E isso me faz lembrar de outras coisas. A todo momento há gente aterrizando no lugar em que não devia. Administradores que descem, convenientemente, onde é melhor para eles. Líderes que acabam levando seus “aparelhos” para pistas que não são as nossas pistas, as pistas do povo.  Figuras religiosas que nos convencem  a orientarmos nosso “pouso” para enganosas terras. O próprio destino, muitas vezes, acaba nos levando a alheios campos.

Tenham um pouco de paciência com o pobre do comandante. Afinal de contas, todos nós, em algum ponto, acabamos errando o destino. Faz parte de “ser” humano. O importante é ligar os motores, acelerar e levantar voo, de novo. E, depois, ir atravessando as nuvens em busca do objetivo correto. E mais importante ainda é que, quando estivermos descendo e percebermos o erro, não fiquemos desesperados. Podemos, por causa da turbulência mental, destruir nossas aeronaves num pouso brusco e morrermos em inesperadas pistas, de inesperados aeroportos...


Wednesday, January 15, 2014

Demônios do Norte, demônios do Sul

Demônios do Norte, demônios do Sul


 Berrendo Middle School, Novo México, Estados Unidos: Um garoto de 12 anos saca a arma e atira em dois de seus colegas. Um funcionário da escola intervém e para o garoto. Um menino em estado grave e uma menina ferida. Perto de Tampa, na Flórida, um policial aposentado de 71 anos atira em outro homem dentro de um cinema, depois de discutir com ele por estar “texting” em seu celular...A vítima morreu.
Todos já conhecem a cultura americana de usar armas. Resquícios do velho oeste? Mas e o garoto de 12 anos? Entretanto, não é a primeira vez que garotos aparecem em noticiários relacionados com uso de armas. Em outras partes do mundo já se usaram crianças para batalhas. Em nosso país sabemos que às vezes se usam os menores para matar e assim cometer um “crime perfeito”, pois eles não podem ser processados.

Assim é que existem loucos e monstros de pouca idade e outros crescidos, por todo o mundo. Temos velhos monstros e monstros velhos. Temos, todo dia, novos monstros e monstros novos. São os demônios desta nossa Terra, os demônios do Norte e os demônios do Sul.


Monday, January 13, 2014

Sarneylândia

Sarneylândia



Às vezes tem-se a impressão que o destino trama contra nós. O Sarney, convidado a ser vice do Tancredo na chapa para presidente, acabou se tornando o primeiro mandatário após a morte –morte,estranha morte – do grande político. Primeiro mandato depois da ditadura limitar, que ironia, fomos direto do regime de exceção para a antiga política dos coroneis. Isso é conspiração dos deuses, posso lhe dizer.
O fato é que, quem já tinha tudo, nunca parou de ter mais. O Maranhão inteiro é dele, e mais, além do Maranhão, só Deus sabe. Não é surpresa que, dominando todos os meios de comunicação e outros meios não tão convencionais, sua filha Roseana tornou-se governadora do estado. Melhor seria dizer “governadora contra o estado”.
Leio nos jornais o que ela está fazendo por lá e não acredito. É o “Alice no país das maravilhas” versão tupiniquim, ou a distopia, ou, simplesmente coisa de maluco. Só pode ser uma campanha da imprensa de outros estados contra ela, não pode ser verdade.
Ou é? Então, parafraseando outro, da mesma estirpe de Sarney, poderíamos perguntar: “Que estado é este?”

Melhor não responder. Já há tanta desgraça no mundo, no país, para que ouvir mais?

Sunday, January 12, 2014

No céu azul, o gene da idiotice

No céu azul, o gene da idiotice

(nossos queridos e heroicos amigos que fazem parte de tripulações nos céus do Brasil, têm que passar por cada uma...)



Quando a gente pensa que viu quase de tudo, aparece mais uma. O voo Azul 5195 saiu bonito, dentro de um outro azul, o do céu. Dentro da aeronave, porém, negras nuvens começaram a se formar. Quem poderia imaginar que de uma cidade tão linda e cheia de praias, Natal, poderia sair um passageiro tão...? Vou ver se arrumo um adjetivo depois, no momento não me ocorre nenhum. No final desta narrativa, quem sabe o leitor amado poderá me ajudar com o vocabulário. Alguém poderia dizer que ele não é de lá, é de São Paulo. Ainda assim, como alguém, que passou uns dias neste lugar tão belo, pode fazer algo tão... Estou de novo sem palavras. Não fique nervoso, vou contar o que aconteceu, se você ainda não leu a notícia.O fulano, não deram seu nome e não quero saber, começou a discutir com a esposa. Nessas brigas, você sabe, os dois pensam que têm razão, mas nenhum dos dois tem. Isso não importa, o que importa é que o “cara” não parou por aí. Levantou -se, tirou a camisa e começou a xingar os integrantes da tripulação. Não disseram se era do tipo que faz ginástica, mas isso não importa, porque o que importa aqui é o cérebro do indivíduo e não corpo. Finalmente recebeu ordem de prisão e foi dominado com o auxílio dos passageiros. O comandante precisou fazer uma parada não planejada em Salvador. Daí, uma série de inconvenientes para todos, depoimentos, Polícia Federal, etc. Então, se alguém perguntar se está tudo azul, não, não está!
Fico pensando no diagnóstico. Drogas, bebedeira? Ou talvez um problema mais sério? Um desvio de elevado grau no DNA? Gene da idiotice?

Antes de terminar, porém, queria dizer que ainda não achei o adjetivo que estava procurando lá em cima. Aceito sugestões...


Saturday, January 11, 2014

Infância em Perus

Infância em Perus



Oito anos, que idade é essa? Agora não sei, mas nos anos 50, era uma época de fantasia e de sonhos. Claro, havia as tragédias também. Vinham das bocas dos adultos falando de pessoas que ficaram soterrados nos poços de água que estavam cavando. Pessoas que foram atropeladas pelo trem ou que tiveram membros amputados nas linhas. Outras tristezas que eu não entendia, faladas à meia boca. Eu as podia sentir, entretanto.
Havia igualmente as tragédias coletivas. Aquela água lamacenta das enchentes cobrindo tudo, enterrando sonhos e o pouco que as pessoas tinham.
Eu via tudo lá de cima, do Morro São Jorge. Eu não tinha um reino, mas era um príncipe, vendo tudo do alto. Em dias normais, as pessoas pareciam formiguinhas andando na praça, nas ruas. Nos finais de semana, eu assistia, de camarote, aos jogos de futebol no campo do Portland.
De manhã, os trens vindo de Caieiras. Mais tarde, outros voltando da Luz. Pessoas tentando ganhar a vida, pessoas batalhando, se esforçando. Lá de cima, aquilo era meu playgorund, e eu me sentia importante. Mas logo cedo percebi que quem controlava tudo era o destino e não eu. As tragédias e a felicidade era ele quem determinava.
Mas o divertido,  mesmo, eram o circo e o parque, que, de vez em quando, apareciam por lá. As pessoas, alegres, rindo, comendo pipoca, comendo sanduíches...E as músicas, então? Agnaldo Rayol, Nelson Gonçalves e Noite Ilustrada, cantando amores que então eu desconhecia. Boleros, em espanhol, espalhando pelo ar tragédias de amor, e outros impossíveis amores que eu nem suspeitava que existissem.  A minha alma de criança nem desconfiava que aquilo era tudo um preâmbulo da existência. Eu só queria saber da diversão, mas, lá, bem no fundo, já tinha minhas dúvidas.
Minha alma de criança já desconfiava que, talvez, a vida, por mais bela que fosse, também escondesse seus medos, suas frustrações, seus momentos de dor. Mas o coração de criança é, e era, tão pequeno, tão pequeno, que mal podia conter toda aquela alegria. Não havia espaço suficiente para o mal, para a desconfiança e para a melancolia.

E foi assim que consegui continuar vivendo, lembrando-me sempre, de que um dia fui criança, e que isso era muito bom...



Estranhas Histórias

Thursday, January 9, 2014

Bota aqui o seu pezinho...

Bota aqui o seu pezinho...
(lembranças do seminário)

“OI BOTA AQUI , OI BOTA AQUI
O SEU PEZINHO
OI BOTA AQUI, OI BOTA AQUI 
JUNTINHO AO MEU 
E DEPOIS NÃO VAI DIZER
QUE VOCÊ JÁ SE ESQUECEU”
(canção infantil)


Até onde pode ir a idiotice humana? O fanatismo? Acho que não tem limite. Basta você deixar correr... que vai correr indefinidamente. No seminário tínhamos um serviço de alto-falantes que funcionava num dos intervalos, no grande pátio onde podíamos nos “divertir” por alguns momentos. Enquanto jogávamos, um de nossos colegas era encarregado de colocar discos (de vinil, é claro) numa velha vitrola numa sala específica para isso. Geralmente eram hinos, música instrumental, música clássica. Perdido no meio dos “LPs” havia um de músicas infantis, Nada mais apropriado para nós, meninos com vocação. Afinal éramos “meninos de Deus...”  Entre as músicas do LP existia uma que dizia “Bota aqui o seu pezinho... juntinho ao meu” . Ninguém tinha prestado muita atenção na letra, pois era apenas mais uma canção infantil.  Numa bela tarde corre a notícia. Nosso colega, encarregado da sala do som, havia sido severamente advertido. Aquela canção aparentemente era muito “erótica”.  Lógico, ninguém usou essa palavra, pois certamente era uma palavra também proibida. O LP foi banido para sempre, e, pela primeira vez, aprendi que havia malícia no mundo... Obrigado, mais uma lição de vida.


Saturday, January 4, 2014

A moça do penúltimo vagão

A moça do penúltimo vagão


O subúrbio que a gente pegava na volta nem parecia o mesmo. De manhã, aquela confusão, aquele aperto. No final da noite, era tudo melhor. Depois da última aula, a gente corria e entrava no penúltimo vagão. Cada um tinha seu lugar certo, eram no máximo vinte pessoas no carro inteiro. Ninguém mudava de posição. Em turminhas de dois ou três, conversávamos, cansados, sobre o dia que tínhamos tido.
Saíamos da Estação da Luz e quando chegava a Barra Funda, entrava mais uma turminha. Na Água Branca, de novo, outro grupinho, geralmente de estudantes,  e cada um pegava seu lugar. Só que essa turma era especial, pois a ela pertencia uma moça, magra, bonita e toda ajeitada. Longos cabelos negros e lisos iam repousar, suaves e sedosos, sobre a blusa fina. Sentava-se sozinha sempre no mesmo banco. Com delicadeza e classe colocava o fichário no colo e olhava para o ar. Isso porque não queria, nós sabíamos, que nós pensássemos que ela estivesse olhando para alguém. Ela sabia, porém, que todos olhávamos para ela e todos nós sabíamos que ela fingia não saber. Era uma graça, era a garota do trem. Delicada, suave e fina. Todo mundo suspirava, fingia que não olhava, mas olhando todo mundo estava.

Eram dois ou três minutos de silêncio, ninguém conversava. Com o canto dos olhos, todos tentavam ver se naquela noite havia algo diferente, mas nunca havia. Era ela, sempre graciosa, sempre fina e elegante. Daí chegava a estação da Lapa. Era quando o namorado dela entrava e a graça acabava. Todo mundo voltava a conversar, fazendo de conta que tudo estava normal...e estava. Finalmente, todos chegávamos e descíamos na mesma estação: Perus. Ela, abraçadinha com o namorado, seguia para casa. Nós também, seguíamos sozinhos para as nossas, sonhando com a moça e esperando a próxima noite chegar...

Thursday, January 2, 2014

Minha tia Biga e minhas primas: lembranças

Minha tia Biga e minhas primas: lembranças



Sempre que podia, “fugia” para a casa de minha tia Biga no Chora Menino.  Era longe, mas valia a pena. A tia, ainda como hoje, era aquela doçura de ser humano que é difícil de se encontrar por aí. Tentei, várias vezes, definir o que a faz tão especial, mas nunca consegui achar uma definição. É alguma coisa dentro da alma e que poucas pessoas têm. Sorte minha que a conheci tão bem. Minhas primas, a Vera e a Cida, se saíram à mãe, com a mesma suavidade. Uma alegria, que eu nunca consegui explicar, no semblante, e um sorriso gostoso que consigo ver e sentir até hoje, tantas décadas depois.
Falávamos besteiras puras e inocentes, contávamos piadas, ríamos. Tínhamos nossa própria linguagem, nossa própria maneira de ver o mundo, nosso próprio jeito de sentir as coisas. O dia passava tão rápido que parecia menos de uma hora e a hora parecia um minuto e os minutos voavam como segundos. Na época eu já sabia que esses momentos eram preciosos, mas agora eu sei mais ainda. São guardados como um tesouro na mente e no coração.

Claro que existem muitas coisas pelas quais vale a pena ter vivido. Esta época da vida, com certeza, é uma delas.