Tuesday, October 25, 2016

A Lenda de Oropacen


Neste dia, a horas de véspera, 
houvemos vista de terra! 
Primeiramente dum grande monte, 
mui alto e redondo; 
e doutras serras mais baixas ao sul dele; 
e de terra chã, com grandes arvoredos: 
ao monte alto o capitão pôs nome  
o Monte Pascoal e à terra – 
a Terra da Vera Cruz.


(A CARTA DE PERO VAZ DE CAMINHA)


A Lenda de Oropacen

Índio guerreiro, veloz, ele caminha pela mata ao longo do oceano. Vez ou outra uma brecha se abre e ele, por entre as árvores, vê o infinito das águas. Ele gosta do mar, gosta de nele com seu corpo brincar. De repente, porém, tem uma imponente, mas também sinistra visão. Ao largo, no meio das águas, vislumbra as velas dos navios portugueses destacando-se no azul do céu, pairando sobre as ondas. Sente ao mesmo tempo uma emoção, e uma terrível opressão. Algo diferente estava acontecendo. Seu coração selvagem, embora ignorante, sabia que nada mais seria igual. Pela primeira vez o corajoso guerreiro tremeu, diante de um inimigo desconhecido.

Voltou. Passos céleres para sua tribo. Conta as novidades e também seus temores. Um inimigo diferente. Sem arcos ou flechas, mas provavelmente com outras armas temíveis, desconhecidas, nunca vistas por estes lados. É o que seu coração dizia. É o que temia. Os outros não sentem ou fingem não sentir nenhum temor. Oropacen, esse era seu nome, guerreiro tupinambá, é de repente desprezado por alguns de sua própria gente. Um tupinambá não deve nunca temer. Ele, porém, lutador de longas batalhas, sabia a diferença. Temia nenhum outro que fosse como ele, mas aquelas embarcações eram de mau agouro. Não eram coisa daqui, não eram coisa boa, eram coisa de se evitar. Eram forças contra quem, ninguém, por mais valente, devesse ou pudesse lutar.
Oropacen, que significa “arco e corda”, sentiu que tinha de salvar os seus. Não era covardia não, simplesmente não era hora de enfrentar. A batalha ali não seria uma de arcos e flechas. Seria uma muito maior e a vitória, a única possível, era se preservar. O chefe ordena que a tribo deve ficar. Eles e mais alguns decidem partir. Juntam poucas coisas e penetram fundo na floresta. Um pequeno grupo, talvez a semente de uma nova nação. Andam dias, meses, e continuam andando. Vão parar em terras onde é difícil chegar. São uma nova tribo. Aí então têm seus filhos, e vivem gerações. Por um tempo enorme não ouviram falar dos inimigos, aqueles que chegaram nos navios. Foram morrendo em paz, aos poucos, e com a certeza de que seus filhos viveriam uma vida de índios valentes, com combates que valia a pena praticar. Só muito, muito mais tarde, é que os brancos lá chegaram. Foram os netos de seus tataranetos que tiveram de com eles lidar. Aí foi uma luta diferente, com outras armas. Oropacen então, já dormia em paz na sua urna mortuária. Seu espírito contemplava as estrelas do céu. Lutou a guerra verdadeira, a que tinha de lutar. Tanto quanto pudera. Vencera tudo que pudera vencer. Manejar armas nem sempre é a melhor maneira de se ganhar. Sim, Oropacen  perdeu o mar, mas ganhou o céu e o verde das matas, com suas plantas e seus animais, para si e para os seus. Oropacen podia agora descansar em paz...


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