Saturday, March 21, 2015

O depósito da Antárctica

O depósito da Antárctica


Foi um de meus primeiros empregos. Eu me sentia muito importante. Além do mais, uma moleza, era pertinho de casa. Eu fazia os “mapas” de entrada e saída de bebidas do depósito da Antárctica. Caixas de Pilsen Extra, caixas de Malzbier, de Guaraná, de Soda Limonada e até de Club Soda. Só mais tarde eu aprendi para que esta última servia.
Era uma folha enorme, pegava a mesa inteira. Chegava o caminhão da fábrica, eu registrava as caixas, saíam os caminhões para os bares e vendas, eu registrava a saída. Tudo no lápis e na borracha. A soma das colunas de saída e entrada era na calculadora. Era daquelas antigas, mecânicas, com uma manivelinha do lado. Quando alguém a estava usando, ia no lápis e papel mesmo, e era aí que eu me tornava realmente importante. Excel e outros programas, nem nas excelentes cabeças dos autores de ficção científica. Computadores? Nem aqueles de  cartões perfurados. Bons tempos, hein? Quer dizer, em alguns aspectos, sim. Era ou não uma coisa essencial  o que eu fazia? O meu patrão e dono do negócio era o “seu” Garcia. Havia vários motoristas, um deles era o Idabir, dele eu me lembro.
Nessa época, tive minha primeira lição de “marketing”. Para ter direito ao “Guaraná Antárctica”, o comerciante precisava comprar as cervejas. Represália contra a concorrente que só vendia a sua famosa cerveja se o estabelecimento também comprasse o não tão famoso Guaraná da Brahma. Não havia moleza e o “seu” Garcia não estava lá para brincar, não. Eu era muito novo ainda e nem sei se fazia meus mapas direito. Por outro lado, desconfio que ele tinha tudo na cabeça, caixa por caixa. Mais tarde, o depósito foi para um lugar muito maior.
Para vir trabalhar era fácil. Andava um pouco pela Dona Rosina, rua da minha casa, lá em cima, e depois”rolava” morro abaixo até chegar na “Fiorelli Peccicacco”. Na verdade eu vinha quase “caindo”, tão íngreme era o percurso. A ladeira, na época, era uma mistura de pequenas escadas, rampas e curvas. Quando chovia, virava um pequeno rio, cheio de buracos. O duro mesmo era subir de volta. Mas que encurtava o caminho, encurtava. Se viesse pelo Morro do Cartório e pela Praça, era quatro vezes mais longe. Até olhei no Google Mapas, nem sequer nome para a ladeira puseram lá.
Minha “carreira”, como “mapista da Antárctica”, foi curta, mas foi muito boa, nunca esqueci. Muito tempo passou e vejam só o que aconteceu: a Antárctica e a Brahma acabaram ficando  juntinhas, “de mãos dadas”. Uma pena que nem tudo é assim. Muita gente e muitas coisas acabaram de distanciando para sempre, como essas mesmas lembranças que acabo de narrar. É a vida, não é?


ooooooOOO0OOOooooo

A crônica acima não faz parte do livro abaixo

Essa vida da gente

Para adquirir este livro no Brasil 

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