Sunday, November 3, 2019

Useiro e vezeiro

Useiro e vezeiro



Era uma verdadeira tortura. Sentado, suando,  preparava-me para enfrentar a indômita e temível máquina de escrever. Daquelas bem antigas. Isso eu digo agora, porque então, até que ela era moderna. A seguir, pegava duas folhas brancas, colocava um papel  carbono no meio  e as passava pelo rolo. Acertava as margens e começava a torcer para não errar. A meu lado, em pé, preparando-se para ditar, o respeitável advogado Dr. Mesquita.
Culpa minha. Quando me candidatei para o cargo, disse que sabia datilografar. Antigamente isso era até profissão. Vai ver que até tinha sindicato próprio! Ocultei o detalhe que exercia a nobre profissão com apenas dois dedos. Nessa categoria, até que eu era rápido. A verdade é que eu tinha sido aceito por outras qualidades. Estava fazendo colegial, tinha estudado em colégio de padres e certamente conhecia um pouco de Latim. O Dr. Mesquita, obviamente, deduziu que, pelo menos, eu não ia estranhar seus “latinismos” nas petições judiciais.
Voltando ao assunto da tortura, a parte realmente complicada era errar ao bater uma tecla. Uma vez cometido um erro, você tinha de voltar no texto, colocar um papelzinho especial com tinta branca na frente da letra criminosa e bater de novo, a letra errada. Essa  “desaparecia”, você voltava o “carro” da máquina e batia a letra correta. E, então, você rezava para não acontecer de novo. Era um suplício.
O local de trabalho era um colégio. Era também imobiliária e, certamente, um escritório de advocacia. Enquanto o advogado e dono da escola não estava lá, eu fazia um pouco de tudo. Aquela hora, porém, era sagrada. Ele cuidava de causas criminais, divórcios e outras disputas em geral. O que mais havia, porém, eram os casos de despejo. Depois de descrever o autor da ação (brasileiro, casado, RG número tal, residente, etc, etc...), vinha a descrição do coitado do réu. Aliás, eu achava um desaforo chamarem aquelas pessoas de “autores”. Onde se viu? Para mim “autores” eram Machado de Assis, José de Alencar e outros. O réu, inescrupulosamente, era adjetivado de “useiro e vezeiro” em atrasos. Demorei um tempão para entender que o “useiro” era porque o coitado do inquilino “usava” muito o ato de atrasar, não se sabe por quê. Provavelmente porque não tinha dinheiro. O “vezeiro” era porque ele fazia isso muitas “vezes”.
O que eu lamento daquela época é que o Dr. Mesquita nunca me colocou para dar aulas no seu colégio. Claro, eu não podia, ainda nem estava na faculdade, mas ele poderia ter achado alguma função que não fosse aquela de ficar “errando” na terrível Remington.
Nem dá para acreditar que hoje existem computadores e esse maravilhoso “Word” para o qual não há limite de erros. Ele corrige todos, sem remorso, sem exceção, impunemente. É fantástico, não é?  Outros erros da vida, entretanto, devo advertir que não são tão fáceis assim de serem apagados. Esse software ainda não foi inventado.

Lançamento no Clube de Autores:  Insólito


Para comprar no Brasil ( impresso ou e book) clique: 


Para comprar nos Estados Unidos clique

Thursday, September 12, 2019

Quero teu abraço




Quero teu abraço

Tu vens, cansada e sofrida,
E, aflita, me pedes um abraço,
e que cure tua ferida.
Teus olhos cheios de tristes lágrimas,
dilaceram meu coração.
Esta é minha proposição:
vamos fazer uma troca,
pego para mim tua dor,
e tu, em contraposição,
me dás um demorado abraço?
Não é isso que é o amor?

                               Flávio Cruz

 ===(((()))===



Lançamento no Clube de Autores:  Insólito

Para comprar no Brasil ( impresso ou e book) clique: 


Para comprar nos Estados Unidos clique

Monday, August 5, 2019

A Nila está falando



A Nila está falando
 
A Nila, minha netinha, está sempre falando.
Fala sobre todos os assuntos.
Explica, explica. 
Conta muitas coisas, todas interessantes.
A bisavó dela, a dona Eleta, falava muito também.
 pensou se ela ainda fosse viva?
Fico imaginando as duas conversando, conversando...
Ei, vocês duas, posso falar um pouquinho também?

 ===(((()))===


Lançamento no Clube de Autores:  Insólito

Para comprar no Brasil ( impresso ou e book) clique: 


Para comprar nos Estados Unidos clique

Saturday, July 27, 2019

Moldura




Moldura

O pintor rima as cores,
o poeta pinta as dores...
Juntos, compõem um poema,
cheio de belas cores,
e de sofridas dores...
Tudo isso, porém,
com uma gentil, bem-feita,
ideal, moldura de flores...



Para comprar no Brasil 
(impresso e e book):


À procura de Lucas  (Flávio Cruz)
----------------------------------------------
Para comprar nos EUA:


Sunday, July 14, 2019

A dama do 747





Era maio de 1980 e eu estava fascinado só de olhar aquele monstro de avião, o Jumbo 747. A companhia era a Aerolineas Argentinas. Quando pude ver sua altura, olhando para ele, ali da sala de embarque, imediatamente achei que era impossível uma coisa daquele tamanho voar com elegância pelo céu. Ainda continuo com essa impressão até hoje e ainda acho que é um milagre cada vez que ele levanta da pista para o firmamento.
Era tudo novidade para mim, desde os procedimentos de embarque, as pessoas diferentes que estava vendo, até o fato de haver passageiros falando línguas diversas. Dali a pouco estava sentado no bojo daquela máquina sagrada, prestando atenção a todas as instruções. Mais uns minutos e voava  para Nova Iorque. Não sei se foi a emoção ou outra coisa, mas não se passou mais de meia hora eu eu tive um ataque de tosse, daqueles teimosos e ruidosos. Fiquei apavorado. O que se faz numa situação dessas? Além do incômodo para mim mesmo, eu estaria incomodando uma plateia de elite que estava me acompanhando naquela ocasião solene. Parecia que não ia parar. No entanto, houve um pequeno intervalo em que pude respirar com mais alívio. Aproveitei para engolir um pouco de saliva para, quem sabe, talvez, mitigar aquela situação. Foi aí que ouvi uma doce e delicada voz falando em inglês. Dizia que eu deveria experimentar umas balas. Olhei para ela e era uma senhora de classe, magra, elegante, de uns 70 anos, que estava sentada a meu lado, estendendo sua mão. Ela me disse que eram “cough drops”. Chupei a primeira e já aconteceu o segundo milagre: minha garganta virou uma seda e eu parei imediatamente de tossir. Um alívio enorme. Daí comecei a conversar com a fina dama. Falou que iria ficar uns dias em Nova Iorque e depois iria para Londres. Na inocência de minha primeira viagem de marinheiro do ar, fiquei entusiasmado por vários motivos. Um deles foi treinar Inglês – nunca antes testado em estranhas terras – começando com aquela figura, quase uma personagem de um um romance. Enquanto conversava, pensei comigo, que fazia ali num avião vindo de Buenos Aires tão distinta personagem? Tudo que estava esperando era ver alguns argentinos falando alto dentro da aeronave. E o Inglês dela... Por motivos cronológicos e bastante óbvios, nunca ouvi o Shakespeare falar em pessoa, mas poderia jurar que era uma versão feminina do próprio, soltando no ar sons majestosos. Não resisti e fiz um elogio:
-Como seu Inglês é perfeito!
Coisa idiota de brasileiro deslumbrado, deveria ter ficado quieto. Consegui juntar minha ideia preconcebida de nossos “queridos” irmãos argentinos, com algum DNA tupiniquim. Ela, educada e com classe me respondeu:
-I AM English...
Minha garganta quase secou com a obviedade da declaração, mas consegui disfarçar e me recuperar. Polidamente falei pouco com ela durante o resto da viagem. Achei que uma mulher tão especial tinha direito a uns momentos de paz e privacidade. Meu deslumbramento só voltou quando, das janelas, avistei a majestosa Manhattan... Apesar de meu enorme  “fora” foi um evento delicioso, que merece ser lembrado.

ooooooOOO0OOOooooo






Lançamento no Clube de Autores:  Insólito

Para comprar no Brasil ( impresso ou e book) clique: 



Para comprar nos Estados Unidos clique



Friday, June 28, 2019

Imersão profunda


                                       Imersão profunda


O lugar era um apartamento vazio, sem paredes, aquele esqueleto de concreto no ar. Havia mais pessoas e acho que as conhecia. Conversávamos sem falar. Um diálogo absurdo, uma mistura de esperança e desespero. Precisávamos de abrigo, precisávamos sair dali. Alguém sugeriu, sem usar palavras, que havia uma escada. Alguns foram, eu fiquei. Precisava pensar mais, deveria haver uma resposta. Poderia ser um sonho e, se fosse, era inútil me preocupar. Algo, em minha mente, garantiu que não era. Passei os dedos no chão e olhei para eles. Lá estava o pó. Era ele prova de que aquilo tudo era verdadeiro? Por algum motivo tinha convicção absoluta de que não estava sonhando. Às vezes você simplesmente sabe.
Senti uma vontade enorme de vencer. Olhei para todos e lados e então eu vi. Penduradas em uma das colunas, havia um par de asas. Asas mesmo, como se fossem de pássaro, mas eram de metal. Eram feitas de folhas pintadas de azul, de ouro, mas havia outras tonalidades. Ficou claro o motivo de sua presença. Eu tinha de vesti-las e sair voando pelo espaço. Certamente elas me levariam para um lugar seguro. Não só seguro, um lugar de prazer, de vitória, de paz. Elas se encaixaram perfeitamente em mim.  Bati os braços um pouco, para ver se funcionavam bem. Se houvesse espaço, eu poderia treinar um pouco. Treinar o voo.
Estava claro que aquilo era um desafio. Eu tinha de ousar, de me jogar no espaço.  Precisava de coragem. Precisava voar. Precisava fazer uma imersão profunda no vazio do ar. Foi então que me lembrei: Imersão Profunda!
Era o nome do novo “game” que tinha sido lançado, o maior desafio já criado no gênero. Houve muita controvérsia, quase proibiram sua comercialização. Mas a companhia tinha vencido. Era isso, eu estava em pleno jogo. Havia algo de muito diferente nessa nova diversão. Você precisava voar, sair do esqueleto de concreto. Se não conseguisse, ficaria para sempre preso no prédio não acabado, ou seja, jamais sairia da realidade virtual. Meu Deus, era isso mesmo? Como alguém poderia ter criado uma barbaridade dessas? Como eu tinha sido seduzido por algo tão cruel?
Eu então tive certeza. Eu estava imerso naquela realidade virtual, mais forte que a própria realidade. Eu estava naquela imersão profunda e precisava vencer, precisava mergulhar no ar. E eu não sabia se iria conseguir...

o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o
0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o
=====================================  

Imagine um país que vai de São Paulo até o Uruguai, numa outra realidade. Imagine agora que este país foi dominado pelos alemães e agora são seus habitantes. Esta nação é GERMÂNIKA e pertence a um universo paralelo ao nosso.
Leia GERMÂNIKA, disponível no Amazon.

 
 https://www.amazon.com.br/gp/product/B08L8J2T3N?pf_rd_r=CYFBX2B84JYSAVG63E5G&pf_rd_p=72a7651a-a7d8-4551-b248-c61480b6ce6e