Tuesday, November 29, 2011

Lilly, Henry, Marcelo e Renata



Lilly, Henry, Marcelo e Renata

Lilly amava Henry e morava com ela mas não eram casados. Por quê? Porque Henry havia se casado com Renata, que na verdade amava Juan que não queria se casar. Henry e Renata eram casados, porque eram amigos, e foi por Renata precisar de documentos aqui na América, que ele com ela se casou. Henry apresentou Lilly para Renata, porque, afinal de contas, não tinha nada de mais, não eram rivais. Estava tudo claro, Lilly sabia que o casamento era “de mentirinha” e Renata sabia que Lilly amava Henry. Henry pensou que  então não havia nada de mais todos morarem juntos, pois afinal de contas, todos sabiam de tudo. Por conveniência ou por sei lá o quê, todos concordaram. Tudo ia bem. Daí então Lilly cismou que o que Renata sentia por Henry era mais que amizade e Renata cismou que Lilly não gostava dela e que ela não era uma coisa boa para Henry, que era uma pessoa bacana e além de tudo, era seu amigo. Nada disso era verdade e tudo tinha um pouquinho de verdade também. Essas coisas são difíceis de medir. Além disso, havia o problema de culturas diferentes, barreiras linguísticas e muitas outras coisas mais. No meio dessa confusão toda,  Renata conheceu um tal de Marcelo e se apaixonou por ele. Henry que, apesar de ser só amigo de Renata (embora, repito, fosse casado de papel) , começou a sentir um pouco de ciúmes, pois afinal ele era o marido. Marcelo foi apresentado a todos e ficou a par da situação. Marcelo, embora soubesse de tudo, achou que Henry não tinha o direito de ficar casado com Renata porque era ele quem a amava e esta história de documentos era besteira. Ele queria voltar para o Brasil e levar Renata consigo, deixar tudo isso para trás. Henry, agora, começou a gostar mesmo de Renata, primeiro por causa do desafio, segundo porque, agora percebia, Renata era mesmo uma mulher e tanto. Fizeram uma reunião pois a situação estava confusa. Foi uma boa briga, em parte porque o que queriam eram coisas diferentes e em parte porque havia uma tremenda confusão linguística. Passaram-se uns dias e, por acaso,  Marcelo estava na rua e encontrou  Lilly. Resolveram tomar um café e aproveitaram para se desculpar pela confusão do outro dia, afinal eram todos civilizados e não havia motivo para brigar. Marcelo então percebeu que Lilly na verdade era uma boa pessoa e uma gracinha de mulher. Lilly, agora que estavam a sós, também achou que Marcelo  era uma boa pessoa e só não entendia como podia gostar de alguém do tipo de Renata.
 Acabaram se encontrando outras vezes e se amando. Renata e Henry se sentiram traídos pelos dois, como pode? Acabaram ficando mais amigos ainda e fizeram uma frente contra os que, agora pareciam ser seus inimigos. Mas que diabos! Afinal de contas, os dois eram casados de documento e tudo, o melhor era mandá-los às favas, aqueles falsos e traidores. Foram para outra casa e Marcelo veio morar com Lilly. Acontece que Marcelo também não tinha documentos e Lilly acabou apressando o casamento entre os dois, pois, além de garantir o amor de Marcelo, bem, era melhor para todos.
Espero não ter feito nenhuma confusão e espero não ter deixado você confuso. Os quatro passaram a viver muito felizes, cada casal em sua casa, todos cidadãos desta grande nação, documentados e dentro da lei e tudo mais.
Estou me  esquecendo de algo...Ah, sim! Lilly, Marcelo, Renata e Henry viveram felizes para sempre. Não, não era isso! O que eu estava me esquecendo era do Juan. Pois bem, eu sinto muito, mas o Juan ficou de fora.

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Quadrilha -   Carlos Drummond de Andrade

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história
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"Carlos amava Dora que amava Lia que amava Léa que amava Paulo
Que amava Juca que amava Dora que amava Carlos que amava Dora
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava
Carlos amava Dora que amava Pedro que amava tanto que amava
a filha que amava Carlos que amava Dora que amava toda a quadrilha"...

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Essa vida da gente

(crônicas e contos sobre o cotidiano)







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Saturday, November 26, 2011

A Palhacinha da Nicarágua

A Palhacinha da Nicarágua
















Dessa vez minha passageira era da Nicarágua. Entrou afoita no carro, já falando, já gesticulando. Para ser sincero, os gestos não eram tantos pois um dos seus braços estava imobilizado. Muito pequena, quase uma menina, franzina, magra. Por isso, talvez, seu falar era ainda mais notório, quero dizer por causa do contraste. Normalmente nós, brasileiros, temos muita facilidade em entender bem o espanhol de onde quer que ele seja. No caso daquela menina, quero dizer mulher, era diferente. Não se entendia uma palavra sequer. Talvez falasse muito rápido, talvez seu espanhol estivesse misturado com algum dialeto de seu país, talvez ela tivesse algum problema de fala, não sei. A cena toda parecia uma cena de gibi. Da história toda, até então, só sabia que trabalhava na lanchonete da rede de fast food e que havia se machucado – o braço – durante o trabalho. O que começava a saber de novo, era que ela estava muito, muito brava, estava uma fúria. Cheguei a pensar nos famosos guerrilheiros de seu país, quem sabe ela era parente de um deles. Não, não. Devia ser uma garota pobre dos arredores de Manágua que tinha vindo parar neste grande país para melhorar a vida. Agora ela estava furiosa com alguma coisa, algo tinha dado errado. Estamos quase chegando ao destino quando ao longe vejo uma outra unidade da mesma cadeia de fast food onde a nossa amiga trabalhava. Quando nos aproximamos mais, vejo uma palhacinha pulando, gesticulando, segurando um cartaz da lanchonete . Provavelmente o movimento estava fraco e o gerente botou uma de sua funcionárias, vestida de palhaça, para, com sua movimentação,  atrair a atenção dos motoristas que passavam. Já tinha ouvido falar que alguns negócios que dependem de transeuntes, fazem isto. Minha passageira então aponta para a palhacinha, fazendo uma expressão de quem pergunta: “Agora você entende? Foi isto que aconteceu!” Mas eu ainda não tinha entendido. Chego ao consultório do ortopedista onde ela tinha consulta, entro com ela e quando ela é atendida,  comento com a recepcionista sobre a atitude da menina da Nicarágua.”Pois é, a pobrezinha se machucou enquanto trabalhava na lanchonete. Quebrou o braço.Ela é muito esforçada.” Faço cara de quem não estava entendendo e ela continua. “O patrão mandou ela colocar a roupa de palhacinha e ir agitar na frente da lanchonete para atrair clientes.” Peço para ela continuar... “O gerente falou para ela que tinha de se agitar muito, pular, balançar os braços, erguer o cartaz, pois só assim as pessoas prestam atenção.” Aí ela continua... A garota seguiu tudo ao pé da letra e se agitou tanto que, num dos movimentos, quebrou o braço. Por isso estava revoltada com o gerente. Ela não ligava de ser palhacinha, nem nada, mas precisava falar para ela se agitar tanto? Precisava do emprego, agitou-se toda. Agora sim que ia ganhar menos pois não podia trabalhar, fazer hora extra nem nada, com essas leis trabalhistas daqui, que nem leis são. Agora eu entendia a revolta dela.Se fosse no Brasil, aquele gerente ia ver o que era bom fazer os outros de palhaço. Mas aqui, fizeram da pobre menina, que já era mulher, uma  palhaça. Por isso que a chamei de a “Palhacinha da Nicarágua”, não por desrespeito, ao contrário, por solidariedade e por que acho que as pessoas devem protestar contra o que está errado...Deixa esse gerente ir a Nicarágua para ver o que é bom para tosse, lá ele vai ver quem é  palhaço...

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Thursday, November 17, 2011

Frank Duran e o escritório de advocacia

Frank Duran e o escritório de advocacia

Minha próxima corrida era recolher o Sr Frank Duran num escritório de advocacia em Lakeland, Florida. Muito cedo, 8 horas da manhã, que diabos ele estaria fazendo lá?  Que raios de escritório de advocacia  começa a trabalhar a esta hora? Eu não tenho nada a ver com isto, minha obrigação é levá-lo do ponto A para o ponto B, sendo o ponto A o tal do escritório. O ponto B era um laboratório em Orlando que, como você sabe, é a terra e também a casa de Mickey Mouse, que, por sinal, nada tem a ver com esta história. 
O Sr. Duran me explica que não fora visitar o advogado, embora ele o conhecesse e tomasse conta do seu caso. Ali também não era sua casa, apenas ali marcara por ser mais perto para todo mundo. Pensei comigo, preferia que fosse mais longe pois receberia mais pela corrida. Enfim o Sr. Duran continua a conversa contando sua história, ou seja, uma longa batalha judicial sobre um  problema médico que tivera. O governo, ou a companhia de seguro, dizia que o que ele tinha tido não era um acidente de trabalho, era na verdade um “acidente da vida”, ou seja era uma doença que ele teria trabalhando ou não. Explica os detalhes jurídicos e eu me perco completamente na explicação. Está indo para o laboratório justamente para fazer mais um teste, que, com certeza, iria  dar ainda mais consistência para  seu caso na justiça. Estava já torcendo por ele. Demorou-se um pouco mais do que o normal pois o laboratório estava lotado, mas finalmente estávamos voltando para o escritório de advocacia em Lakeland, ou melhor, para o estacionamento do mesmo. Chegamos e o Senhor Duran desce. Pergunto apenas por perguntar se sua casa está perto, se vai ter de dirigir muito. “Não, senhor, não vai demorar, não. Na verdade,  já cheguei.” Olho para ele com olhar de quem não entendeu e então ele me mostra uma velha van vermelha. Pela janela podem se vistos cabides com roupas penduradas. Ele era um “homeless”. Era uma daquelas pessoas que “moram” no carro. Sem querer brincar  com a desgraça, tenho de declarar que , tecnicamente ele não era sem-teto, pois teto ele tinha, embora fosse muito baixo.
Frank não estava nem envergonhado nem constrangido. Eu estava constrangido por ele. Mister  Frank Duran era o segundo sem-teto que eu conhecia pessoalmente em apenas uma semana. Pela segunda vez meu coração se encheu de tristeza. Uma terra tão grande, tão bonita, tão cheia de riquezas e, em pouco tempo, eu já conhecera dois sem-teto...América, América...



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Saturday, November 5, 2011

Pausa: Boas Notícias

Pausa: Boas Notícias








Todos os dias temos notícias horríveis no jornal. Assassinatos, sequestros, traição, ataques...Coisas inimagináveis, mas que, no entanto, acontecem...Acontecem nos altos níveis da política, entre governos, na classe média, na classe alta e na baixa...Velhos, jovens, crianças e bebês são vítimas. Animaizinhos e até inteiras espécies sofrendo por causa de abuso, agressividade, impunidade...também o são. Todos os dias, em qualquer jornal, você tem a certeza de que vai ver algo ruim. Mas não desanime. Nem tudo é tão mau assim. Coisas boas acontecem também. Almas especiais que salvam, resgatam, sobrevivem e ajudam outras a sobreviver. O acaso, também,  muitas vezes livra muitas pessoas de coisas horríveis. Não é tão comum ver isso no noticiário, mas acontece, e volta e meia podemos saborear, sentir aquela emoção gostosa  de ter algo bom anunciado. É verdade que há muito mais notícias más do que boas. Talvez seja a natureza do jornalismo, baseado, é claro, no comportamento humano que parece se alimentar da tragédia. Não significa que há mais maldade acontecendo do que coisas boas. Há milhões de pequenas ações, todos os dias, em todos os cantos,  que nos lembram que somos humanos e temos alma. Pequenas  gentilezas, sorrisos sem malícia, pequenos favores...Favores que não pedem retorno, ajuda para alguém que você nunca mais vai ver...Outro dia perdi minha carteira com tudo dentro. Apareceu dias depois no Departamento de Polícia com tudo de volta. Daí olhei a lista das coisas achadas no quadro da parede. Pode imaginar que havia várias carteiras com dinheiro dentro, devolvidas, aguardando pelos seus donos? Muita gente ajuda muita gente que nunca mais vai ver...Nós só ficamos sabendo de alguns casos mais fantásticos que vão para os jornais...É verdade, amigo, há muita gente boa, pode estar certo. Se você prestar atenção, vai começar a notá-las, elas estão sim,  por aí, e não são tão raras assim. Elas fazem o equilíbrio do mundo, impedem que um prato da balança afunde muito do outro lado. Obrigado, para todos vocês que fazem o bem, sem saber a quem..Obrigado!

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Tuesday, November 1, 2011

Tchaikovsky em Perus, São Paulo

Tchaikovsky em Perus, São Paulo

Quando você fica um certo tempo longe de sua terra, as imagens, os aromas, as visões e as lembranças ficam ainda mais vivas. Por isso é que às vezes me lembro do vilarejo onde passei minha infância e dos fatos que lá ocorreram,  com especial intensidade. Perus, norte da Grande São Paulo não era, como agora, um aglomerado de casas e comércio que às vezes se assemelha a secções  de uma grande cidade da Índia. Ao contrário, era uma paisagem quase bucólica há algumas décadas atrás. A estrada de ferro, antes chamada de Santos a Jundiaí, ainda corta o local bem no meio e tem como acompanhante um rio que vai serpenteando a seu lado e , no caminho, acaba dividindo a praça principal bem no meio. O rio e a estrada formam uma espécie de vale cercado de elevações, ou morros, como dizíamos. Na minha infância ainda era tudo muito espalhado, não havia tantas casas assim e elas estavam como que semeadas pelas elevações, enquanto o comércio, os bancos, o cinema e tudo mais, estavam no Centro, em volta à praça. De um lado da mesma, saía uma rua, na verdade uma rampa íngreme, que chamávamos de Morro do Cartório, e que levava a algumas habitações mais para cima , inclusive a casa onde eu morava. O cartório – o Tabelionato Farias, acho – ficava bem no meio desta rua, que subia, subia e continuava subindo. Ao pé da mesma, estava a igreja católica, cuja padroeira era a Santa Rosa de Lima. E antes de continuar a andar pela “cidade”quero parar um pouco por aí. Era uma igreja como outra qualquer, branca, com uma torre, etc. Deve ter mudado desde então. 
Toda tarde, às seis, algo muito especial acontecia. Nessa época a esta altura do dia, as pessoas estavam começando a encerrar as atividades, fechar o comércio, ir de volta para casa. Então, com uma pompa e força inusitadas para todos soava o “Concerto no. 1 para Piano e Orquestra de Tchaikovsky”. O som saía das torres da pequena igreja e ecoava pelas montanhas, pelas ruas, entrava nas casas, ia, ia para além das fronteiras do nosso bairro. Era vibrante, imponente, poderoso, sensacional. Enchia os ouvidos, o ar e a alma. Se você não conhece esta peça, está intimado a ouvi-la. É imcompreensível que um ser humano passe a vida sem tê-la ouvido pelo menos uma vez. É uma peça musical grandiosa, não sei como o compositor conseguiu se inspirar tanto assim...Depois de algum tempo, o som ia diminuindo, sem desaparecer, no entanto. Entrava então  avoz de um locutor, altivo, pomposo: “Ao som deste prefixo musical vai ao ar o Serviço de Alto-Falantes da Paróquia da Santa Rosa de Lima de Perus”. Não podia haver nada mais solene do que isto. Naquele momento Perus e sua paróquia eram mais importantes que o Vaticano, que Roma, que Aparecida do Norte, Brasília ou Rio de Janeiro. Éramos insuperáveis. Tudo parava por alguns segundos, pelo menos na minha imaginação. Nem sei o que o locutor falava depois. Talvez banalidades, anúncios locais.. Não importa. Naquela hora era Tchaikovsky, e  Tchaikovsky  era o papa. Ele nos aproximava de Deus mais do que qualquer sermão, livro, exortação. Era um momento simplesmente lindo. Um momento mágico, infinito enquanto durava (Vinícius, com licença) .
O locutor era meu irmão. Ele faleceu há algum tempo atrás e entre as inúmeras coisas boas e bonitas de que me recordo a seu respeito, essa foi a mais apropriada que achei para homenageá-lo. Como dizem meus filhos, “era a cara dele”...



Concerto No. 1 para piano e orquestra






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