Era
maio de 1980 e eu estava fascinado só de olhar aquele monstro de avião, o Jumbo
747. A companhia era a Aerolineas Argentinas. Quando pude ver sua altura, olhando
para ele, ali da sala de embarque, imediatamente achei que era impossível uma
coisa daquele tamanho voar com elegância pelo céu. Ainda continuo com essa impressão
até hoje e ainda acho que é um milagre cada vez que ele levanta da pista para o
firmamento.
Era
tudo novidade para mim, desde os procedimentos de embarque, as pessoas
diferentes que estava vendo, até o fato de haver passageiros falando línguas
diversas. Dali a pouco estava sentado no bojo daquela máquina sagrada,
prestando atenção a todas as instruções. Mais uns minutos e voava para Nova Iorque. Não sei se foi a emoção ou
outra coisa, mas não se passou mais de meia hora eu eu tive um ataque de tosse,
daqueles teimosos e ruidosos. Fiquei apavorado. O que se faz numa situação
dessas? Além do incômodo para mim mesmo, eu estaria incomodando uma plateia de
elite que estava me acompanhando naquela ocasião solene. Parecia que não ia
parar. No entanto, houve um pequeno intervalo em que pude respirar com mais
alívio. Aproveitei para engolir um pouco de saliva para, quem sabe, talvez,
mitigar aquela situação. Foi aí que ouvi uma doce e delicada voz falando em
inglês. Dizia que eu deveria experimentar umas balas. Olhei para ela e era uma
senhora de classe, magra, elegante, de uns 70 anos, que estava sentada a meu
lado, estendendo sua mão. Ela me disse que eram “cough drops”. Chupei a primeira
e já aconteceu o segundo milagre: minha garganta virou uma seda e eu parei imediatamente
de tossir. Um alívio enorme. Daí comecei a conversar com a fina dama. Falou que
iria ficar uns dias em Nova Iorque e depois iria para Londres. Na inocência de
minha primeira viagem de marinheiro do ar, fiquei entusiasmado por vários
motivos. Um deles foi treinar Inglês – nunca antes testado em estranhas terras –
começando com aquela figura, quase uma personagem de um um romance. Enquanto conversava,
pensei comigo, que fazia ali num avião vindo de Buenos Aires tão distinta
personagem? Tudo que estava esperando era ver alguns argentinos falando alto
dentro da aeronave. E o Inglês dela... Por motivos cronológicos e bastante
óbvios, nunca ouvi o Shakespeare falar em pessoa, mas poderia jurar que era uma
versão feminina do próprio, soltando no ar sons majestosos. Não resisti e fiz
um elogio:
-Como
seu Inglês é perfeito!
Coisa
idiota de brasileiro deslumbrado, deveria ter ficado quieto. Consegui juntar
minha ideia preconcebida de nossos “queridos” irmãos argentinos, com algum DNA
tupiniquim. Ela, educada e com classe me respondeu:
-I
AM English...
Minha
garganta quase secou com a obviedade da declaração, mas consegui disfarçar e me
recuperar. Polidamente falei pouco com ela durante o resto da viagem. Achei que
uma mulher tão especial tinha direito a uns momentos de paz e privacidade. Meu
deslumbramento só voltou quando, das janelas, avistei a majestosa Manhattan... Apesar
de meu enorme “fora” foi um evento
delicioso, que merece ser lembrado.
ooooooOOO0OOOooooo
Lançamento no Clube de Autores: Insólito
Para comprar no Brasil ( impresso ou e book) clique:
Para comprar nos Estados Unidos clique
No comments:
Post a Comment