Monday, November 28, 2016

Goiabada sem queijo




Goiabada sem queijo

Dia especial, a vovó vai visitar a netinha amada lá longe. Hora de curtição, precisa ser aproveitada ao máximo. Conversa para cá, conversa para lá, a pequena mostra vídeos para vovó, cantam em conjunto. Aqueles dedinhos, rápidos na tela, atestam a grande brecha entre gerações. Quem se importa com isso? A vovó também é craque. Enfim, uma festa.
De repente ela fala para a avó:
- Quero ver “Fico assim sem você” da Adriana Calcanhotto!
E antes que a vovó pudesse se lembrar que música era aquela, já no ar se ouvia a melodia:

“Avião sem asa,
fogueira sem brasa,
sou eu assim sem você.
Futebol sem bola,
Piu-piu sem Frajola,
sou eu assim sem você.”

E ela joga seu corpinho para lá e para cá, rindo e cantando. “Num doce balanço”, como diria o Vinicius.
Com ritmo e ginga, continua:

“Neném sem chupeta,
Romeu sem Julieta,
sou eu assim sem você.
Carro sem estrada,
queijo sem goiabada,
sou eu assim sem você.”

Quem resiste? A vovó entra na onda e canta junto.
E assim foi, vezes e vezes.
Finalmente, ela dá uma parada. Daí, então, com um sorriso sério, ela solta:
Sabe, vovó? Eu gosto muito desta música!
-Eu também!
Põe a mãozinha no coração, dá um suspiro e completa:
-Eu sinto uma coisa aqui e me lembro do Pepinho toda vez que ela canta!
E aí estava revelado o segredo infantil! Aos quatro anos, a primeira paixão-amizade.
Daí, ela puxa a vovó pelas mãos e sai saltitando pela sala... Fazendo coisas que crianças precisam fazer!


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Sunday, November 27, 2016

Das cigarras, do Chico Buarque e de outras coisas...


Das cigarras, do Chico Buarque e de outras coisas...


Nessa época de protestos, nada mais justo do que se fazer mais um em nome das pobres cigarras. Talvez  você ache isso desnecessário, mas posso garantir, as coisas aqui consideradas, mudadas as proporções, são muito importantes. Desde que éramos pequenos, pelo menos minha geração, ouvíamos  aquela fábula em que a pobre cigarra era considerada uma irresponsável, preguiçosa, que ficava cantando por aí, sem pensar no seu futuro, sem pensar nos seus descendentes. Não que eu não admire a laboriosa formiga, que não para de trabalhar. La Fontaine, em sua fábula recontada a partir de Esopo, não teve a menor consideração pela coitadinha da cigarra. Eu poderia simplesmente dizer “Não é o que parece”, mas seria simplificar muito. Prefiro explicar os fatos.
Pois bem, agora sabemos que, pelo menos uma espécie de cigarras, vive nada mais, nada menos, do que 17 anos debaixo da terra, antes de sair. Isso por si só, já merece um prêmio Nobel de paciência. Quantos de nós ficamos aflitos depois de apenas alguns minutos no elevador? E tem mais, depois que ela sai, fica pouco tempo por aqui, só o suficiente para procriar, depois acaba morrendo. Sabe aquele cantar insano que elas têm, que não para? Aquilo é para afastar os predadores, ensurdecê-los, proteger suas crias. Cantar é uma forma de luta, sabia? Olha só, num passado não muito distante, o Vandré, o Chico, e tantos outros como eles, cantaram muitas verdades que alguns não queriam ouvir.
Poderia parar por aqui, e já seria o suficiente para justificar a cantoria das nossas amiguinhas. Quisera eu ser comparado ao Chico! Nossa, não dá nem para imaginar. Mas tem mais. O número 17 não é por acaso. Não sei como as danadinhas descobriram que dezessete é um número primo e por isso é mais difícil coincidir sua saída dos subterrâneos com a de uns indesejados predadores. Não me obriguem a explicar os detalhes, pois, nem de longe, vou ter a mesma capacidade que elas têm de entender essas coisas. Fala a verdade, não é demais? Esperar 17 anos debaixo da terra, porque é o tempo certo para melhor proteger os filhotes, depois sair e cantar alto para espantar os inimigos, isso não é tremendo? E esse pessoal falando que elas são preguiçosas. La Fontaine, me desculpe, mas dessa vez você deu um tremendo de um fora! O Esopo, até que eu perdoo, afinal faz tanto tempo...




Mais sobre as cigarras...


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Saturday, November 26, 2016

Estranha síntese de enganos



Estranha síntese de enganos

Sou o que sobrou dos meus erros,
estranha síntese de enganos,
que através de tantos anos,
aos poucos se acumularam.
Para aquilo que restou,
olho, triste, perplexo,
tentando achar algum nexo.
Tento, atento, me salvar,
mas não há mais nada de mim:
só partes a se juntar.
Porém, com muita esperança,
olho cada um dos pedaços,
cada peça, cada estilhaço!
Quem sabe um deles, quiçá,
comece de novo a brotar?
Quem sabe, faça de mim,
um novo ser, que, exuberante,
vá então ressuscitar?

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Thursday, November 24, 2016

O segredo da Lisa




O segredo da Lisa

Ela era apenas uma mulher. Não tinha grandes planos, nem um grande destino. Nem um grande ideal, ela tinha. Era, entretanto, uma mulher suave, bonita, delicada. Por isso e por outras razões não tão razoáveis, Mário se apaixonou. O Aloísio, também. O Alfredo não sabia se apaixonar, no máximo sabia gostar. Foi isso que ele fez. Gostou muito dela.  Mais uns três ou quatro se perderam de amor por ela. Não sei o que era que havia dentro daquela mulher, ou fora, que fazia os homens se apaixonarem tanto. Talvez o mistério, talvez o desinteresse que ela mostrava, talvez sua delicadeza. Ninguém sabia o segredo dela. Ninguém, não. A sua melhor amiga, a Rebeca, sabia de tudo. Sabia tudo da Lisa, isso sim, ela sabia. A Lisa – e esse era o segredo dela - gostava da Rebeca e a Rebeca gostava dela. Um amor tão forte que homem nenhum podia lhes dar. Amor proibido, insensato – insensato para os outros -  esse era o segredo delas.

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Tuesday, November 22, 2016

Andy já não é mais o mesmo...


Andy já não é mais o mesmo...


O que estava acontecendo, pensou ela, é que ele estava cada vez mais arrogante. Antes ele não era assim. Ao contrário antes era uma verdadeira simpatia, solícito, amável. E não que ela fosse de abusar da bondade dele, não. Era agradecida, reconhecia sempre as suas atitutes, a sua maneira de tratá-la bem. Ela sabia que a obrigação primordial dele era cuidar dela como um todo, como pessoa, sua saúde física e mental. Por outro lado, quando se passa o tempo todo junto, as 24 horas do dia, isso não é suficiente. Precisa haver também um cuidar do espírito, da alma. Afinal de contas, ele sabia de todos seus segredos, de suas intimidades, de seu pensar. Custava se preocupar com suas preocupações, cuidar de seus cuidados, cumprir também suas aspirações?  
Não foi de repente. Devagarinho, ele foi percebendo suas fraquezas, sua dependência, suas necessidades.  Sabia que, de um jeito ou de outro, ela acabaria se humilhando, pedindo ajuda. Confessaria suas fraquezas. Foi assim que ele se tornou dominador, presunçoso e o que ela mais detestava: arrogante. O pior é que quanto mais ele agia assim, mais ela se sujeitava, mais ela precisava dele. A coisa chegou a um ponto que se tornou um paradoxo. Andy – esse era o nome que ela lhe dera – era a um tempo o que ela mais precisava e o que ela mais detestava.
Decidiu, não era mais viável,  não era mais possível. Ela tinha de fazer o impossível, livrar-se de Andy. De manhã, bem cedo, saiu antes que ele pudesse notar e dirigiu-se ao departamento próprio para reclamações e reposições e explicou todos seus problemas. A moça, muito gentil, ouviu com muita atenção e disse que ela poderia voltar para casa. Tudo já estava resolvido. Quando chegasse lá, Andy já teria sido substituído por um robô muito mais simpático e que jamais seria arrogante com ela. Cindy, enquanto voltava para casa,  pensou como seria bom se houvesse um robô masculino como a moça que a havia atendido. Ela sim, era simpática e, com certeza, jamais “viraria” um Andy. Enfim, não se pode querer de tudo. De qualquer forma ela sabia que o Mathew, o substituto de Andy, iria cumprir sua missão. Garantido.

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Sunday, November 20, 2016

Ressurectio: uma nova vida




Ressurectio

Sam achou estranho e ao mesmo tempo interessante aquela cerimônia. Há muito tempo ninguém fazia enterros. Pouca gente morria e só nascia alguém quando era necessário. Total equilíbrio da população, planejado e executado pela Inteligência Artificial. Quando alguém, por tédio ou qualquer outro motivo, decidia morrer, todos seus dados, informação genética e mais aquilo que antigamente se chamava alma ou espírito, eram coletados e arquivados num enorme banco de dados regido e mantido pelo sistema. Depois dos 170 anos poucas pessoas ainda queriam viver, embora tecnicamente seus corpos pudessem ser mantidos por muito tempo ainda, através de rejuvenescimento genético e outras maravilhas da Ciência.
Sam viu aquele estranho caixão de madeira ser lentamente baixado num buraco retangular e desparecer lá dentro. Os poucos presentes, todos vestidos de preto, pegaram um punhado de um pó preto, sintético, e o aspergiram sobre o caixão que agora mal podia se ver. Os técnicos da DataEver tinham estudado, através de arquivos, a rudimentar cerimônia de cem anos atrás, a pedido de um dos habitantes da região de York – antiga New York – que queria ressuscitar a cerimônia perdida na história. Extravagância de alguém da elite? Enfim, virou moda. Muita gente agora pedia sua realização quando decidia “encerrar” suas atividades. A grande diferença era que nos verdadeiros enterros de antigamente, os corpos ficavam lá embaixo à mercê da natureza que fatalmente acabava destruindo-os. Nessa cerimônia do século 22, assim que o ataúde descia, era retirado por máquinas no subsolo que “sintetizavam” o corpo, como era o procedimento normal de então.
O pai de Sam, Francis, havia decidido por aquilo e Sam lá estava realizando o desejo do pai. Até que tinha sido interessante, era uma espécie de aula de história. Ele mesmo não poderia pedir para seu descendente fazer isso, pois seu pedido de gerar um ser geneticamente similar, ou seja, “um filho”, havia sido negado.
Outro pedido do pai de Sam era participar do programa de reativação artificial da vida, chamado de Ressurectio. Na verdade, era um programa que estava se tornando bem comum. De posse de todos os dados do falecido, a DataEver criava uma realidade virtual onde o cliente começava a “viver” novamente a mesma vida que tivera no mundo real. A espécie de nova “consciência”, no entanto começava na juventude, já com a bagagem da infância e daí a “vida” continuava praticamente do mesmo jeito que tinha sido antes, até a “morte”. Segundo os autores do projeto, algumas vezes, desejos intensos que os candidatos tiveram em vida e que não foram realizados, tinham sua chance nessa nova existência. Eles advertiam, no entanto, que o resultado final da vida “artificial” seria o mesmo.
Sam colocou seu polegar no pequeno sensor para autorizar o início do programa. Seu pai tinha pago tudo antecipadamente e Sam estava lá apenas para formalizar. Na projeção holográfica apareciam inúmeros caracteres e símbolos que o técnico ia explicando. Segundo ele, Francis estava com dezesseis anos e ia participar do primeiro treinamento para astronauta, carreira que tinha escolhido. Na mesma turma estava Erin - futura mãe de Sam - que mais tarde iria ser sua companheira. Seu complexo genético era perfeitamente compatível com o dele, condição importante para que as autoridades permitissem o “casamento”.
Se Sam pudesse sentir o que seu pai estava sentindo, vivendo, veria que uma alegria enorme enchia seu peito. Estava feliz por estar ali, ao lado de Erin e a vida era maravilhosa.
No entanto, Francis, tinha uma estranha sensação dentro de si. Às vezes pensava que a vida ia saltar de seu peito e, logo em seguida, tinha aquela percepção de que tudo aquilo era um sonho, de que nada era real. Leonard, o técnico tinha conhecimento disso, mas não falou nada para o Sam. Disse apenas que seu pai estava imensamente feliz e ele deu um sorriso, imaginando sua felicidade.
Era um erro no sistema que estavam tentando corrigir, embora soubessem que era difícil. O importante é que Sam se sentiu confortado e realizado por ter levado adiante a vontade do pai. Saiu do enorme prédio em seu transporte pessoal. Lá dentro, Leonard estava fazendo os últimos reajustes no programa do mais recente cliente. Quando ele chegasse no final da vida virtual, faria tudo de novo, iria pedir a cerimônia especial de casamento, a inserção de seus dados no programa Ressurectio e começaria a viver novamente. Virtualmente, é claro. Seria eterno. Talvez aquela vez já não fosse a primeira, talvez fosse a sétima ou a décima vez que ele estava vivendo de novo a mesma vida.

Como ele poderia saber?


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Saturday, November 19, 2016

Vida, vida minha


Vida, vida minha

Vida difícil, vida dura,
vidinha boa, vidona…
Vida nova, vida antiga,
vida, danada de vida.
A gente reclama da vida,
bem vivida ou não,
a vida não é fácil,
quem aguenta essa vida?
No fim das contas, porém,
todo mundo, bem ou mal,
quer continuar vivendo
essa vidinha da gente,
que a gente não pediu,
mas que é bem vinda.
Puxa vida, como a vida é puxada,
mesmo assim é muito bom, 
ter a vida que a gente tem!

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À procura de Lucas


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Friday, November 18, 2016

A menina que chorava...





A menina que chorava...


“Quando chegava o poder de chorar, era  até bom – enquanto
 estava chorando, a alma toda se sacudia,
misturando ao vivo todas lembranças, as mais novas e as muito antigas.”
(Campo Geral – Guimarães Rosa)



Difícil dizer o problema que ela tinha. Estava ali, diante do médico e de todos aqueles aparelhos sofisticadíssimos e nada podia ser detectado. Não se sabia que outro teste ou exame poderia ser feito. Praticamente qualquer hipótese razoável já havia sido considerada.

Agora só restava conversar com a paciente, com calma tentar conseguir alguma informação relevante, algo que pudesse definir a situação. O médico confessou que nunca tinha visto um caso daqueles. Ouvira falar de alguns pacientes, há alguns anos atrás, mas todos foram curados imediatamente, as causas imediatamente detectadas.

Esse era o problema da menina. Ela tinha 11 anos e chorava quase toda semana. Grossas lágrimas corriam pela face e, além disso, ela dava longos suspiros. Claro, chorar não é grande coisa. Entretanto, naquela época ninguém chorava mais. A tristeza havia sido banida cientificamente há um longo tempo. Havia chips de controle de emoção em qualquer ser vivo. A tristeza havia sido cientificamente banida do corpo e da mente humana.

Por que, então, a menina chorava? Seu chip estava em, ordem, seu cérebro também. O médico perguntava, perguntava. O que sentia, por que chorava? Ela dizia que, às vezes, vinha uma tristeza dentro dela e ela chorava. Mas era bom, ela dizia, pois depois ela se sentia muito bem, aliviada. Ela não queria mudar. Mas o médico insistia, aquilo não era bom, aquilo precisava de cuidados. Chorar era coisa do passado. Precisava fazer um painel com seus superiores, explicar a situação. Aquilo poderia ser perigoso. Coisa séria.

A menina, ao ouvir isso, pegou nas mãos do doutor e suplicou: “Não faz isso, não. Estou bem assim, assim eu quero ficar”

O médico ficou em dúvida entre o pedido da menina e seu dever profissional. Hesitou. Não sabia o que fazer. Ela percebeu a hesitação e ficou com medo de lhe darem um daqueles remédios violentos. Aqueles que obrigam a pessoa a ser feliz. Estava com medo. E chorou.

As lágrimas, abundantes, inundaram seu rosto. Seus olhinhos pareciam dois barquinhos num oceano. E olharam para o médico. Ele nunca tinha visto alguém chorar, só em filmes médicos antigos.

Sentiu algo diferente no peito. Sentiu comoção. Estaria ele também com problemas, teria sido contagiado? Na dúvida, fez um gesto para que ela ficasse tranquila. Depois avisou que nada iria fazer, desde que ela continuasse a visitá-lo para acompanhamento.

As lágrimas foram enxutas. Na face da menina, um sorriso e um brilho jamais vistos. Deu um beijo na face do doutor, coisa também incomum. Afinal ela era qualquer coisa, menos comum.

Despediram-se. Ela foi embora. O médico ficou sozinho e sentou-se por uns momentos. Diminuiu um pouco as luzes para meditar sobre o que tinha visto.

Talvez seja impressão minha. Com certeza, estou enganado. Mas pareceu, por uns segundos, que, ali nas penumbras do consultório, vi uma pequena lágrima rolar na sua face...


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À procura de Lucas


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Wednesday, November 16, 2016

Poeta louco, língua insana



Poeta louco, língua insana

Minha língua gostosa. Língua de falar. Também tenho a língua do paladar. Tenho o “tu” para te dar importância, às vezes para te afastar. Tenho “você” para dar intimidade. Tenho “vós” para vos dar majestade. Tenho voz para tudo falar. Tenho avós para me lembrar das palavras que não sei mais. Língua danada. Danada de bom. Danada de boa, me perdoa, nada como a concordância. Agrada meus ouvidos, me faz suspirar. Inspirar. Vocal. Vocábulo, vocabulário, vozerio, vociferar, afônico. Verbo. Vozes da América. Palavra, parábola, parar a bola, poesia parada, sem rima, sem cisma, sem verso, nem  reverso. Sozinho, soneto, sonolento, sem boca para falar. Ou reclamar. Palavra. Palavra escrita, palavra falada, palavra da vida, termo, tremo,trema, palavreado, palavrório. Palavra de homem, dar uma palavrinha. O poeta cisma, descansa na prosa, prosaicamente, rima à deriva, ruma incerto no oceano verbal, descomunal, sem acento. Polissílabos de uma sílaba só, proparoxítonas com acento na última, aversão ao verso versátil e ao verbo regular. Regras regulares de gramáticos incomuns acostumados às exceções, exceto secções da sessão sem síncope. Metáforas, anacronismos, hipérboles, pleonasmo. Plasma.Linfático, linfoma. Metástese. Saturação verbal. Excesso de vírgulas. Acentos sem sentido, sem nexo. Sem fonia, sinfonia, sintonia, sem sentido, semi, sema, semantema, fonema, presufixo, radical total, semântica, palavrão, cacófato inusitado, desusado, desiludido, desilusão do poeta que não sabe escrever em monossílabos, arcaico. Linguista, linguística, linguiça portuguesa, livro sem lista, índice sem livro, livro sem bliblioteca. Livraria grega, livro na internet, publicação anônima, presente de grego. Gênesis, o meio e o ômega. Ômicron, minúsculo, oi, origem do fim, fim do livro, capítulo final, conversa fiada, prosa vulgar, poeta sem sabor, sem rima, sem cisma, sem verso, sem reverso, no avesso, na contramão. Contra a mão que escreve a palavra correta na reta sem fim. Fim. Teu fim, poeta sem graça, que ri da poesia que fez e faz de conta que não sabe de nada. Nihil. Zero. Nihilismo.
Preciso de férias.


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À procura de Lucas


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