Wednesday, October 29, 2014

O Professor de Geografia












O Professor de Geografia 

Renato Stempniewski e Eli Piccolo. Se você conhece estes dois, então, meu amigo, você não é mais tão jovem assim. Sem ofensa. Quando eu estava no antigo “ginasial” eles eram praticamente os únicos autores de livros didáticos de geografia. A capa não mudava e tampouco o conteúdo. Ano após ano. Lá estava tudo. Montanhas mais altas: Monte Everest, 8858 metros, K2, 8611 metros e assim ia. Rios mais extensos do mundo: Nilo, 6650 quilômetros, Amazonas,  6400 quilômetros, Mississippi, etc... Descrições extensas e técnicas de sistemas tropicais, subtropicais, a caatinga e o cerrado, bacias hidrográficas e muito mais. População, densidade demográfica, área geográfica, divisão política, tudo, tudinho. Estava tudo escrito e registrado pelo Renato e pelo Eli. O nosso professor, de um daqueles países eslavos, um sobrenome difícil de pronunciar – o nome era impossível – simplesmente lia o livro para nós. Sua aula era ler, contínua e ininterruptamente todos os dados, metragens, quilometragens. Era implacável. Era lento, mas não parava. Tinha um sorriso infantil e ingênuo no rosto redondo. Os cabelos haviam desistido de crescer há muito tempo. Daí tínhamos de decorar tudo, item por item, para poder passar na prova. Naquela geografia não havia porquês, nem causas, nem consequências, nem mesmo interação com o ser humano, só números, puros, incontestes, absolutos. Não me lembro de mais nada. O pouco que sei, aprendi depois de adulto, aqui e ali, consultando.

Não quero difamar o pobre do professor. Acho que ele nem era professor formado. Ele fazia o que fazia, achava que era certo. Além do mais, não devemos falar mal de quem não está mais presente. Certamente ele já faleceu e, sendo um bom homem, além de padre, está no paraíso. Entretanto, tenho certeza de que lá não está lendo os números do Stempniewski e do Picollo. Lá de cima, ele tem outra visão. Pode ver a graça ao mesmo tempo suave e estupenda da neve que cobre as montanhas, e que têm um tom sutil de azul, quase imperceptível. Pode ver que os rios, de qualquer tamanho, serpenteiam sempre graciosos entre as montanhas e os vales. À s vezes se lançam em quedas loucas, em cascatas e cataratas, só para fazer graça. Que o mar, independentemente da profundidade, na verdade tem tons mil. Que a luz do sol, de dia, reflete em suas águas e cria milhões de pontos luminosos, que mais parecem  diamantes. Que, à noite, os raios de luz  da lua, refletidos nas ondas, parecem pedras preciosas num fundo de veludo. Que a profundidade dos oceanos enumerada nos livros do escritor era irrelevante perto da riqueza escondida lá no fundo. Que a areia dos desertos, iluminada, de cima parece uma grande placa de ouro. Que, lá do alto, as divisas geográficas não podem ser vistas. É um mundão só, contínuo, belo, multifacetado, colorido... Que os homens, bons ou maus, não podem ser vistos lá de cima. A maldade não parece existir, quando você olha de lá.
Não faz mal, professor, nem ligue para meus comentários sobre suas aulas. Desculpe a interrupção, descanse em paz, e aproveite ao máximo essa geografia abstrata aí do céu: sem números, sem estatísticas, sem comprimento, sem altura, sem densidade demográfica, nem coordenadas nem paralelos...Só uma bola azul pairando no infinito...


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Essa vida da gente

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Tuesday, October 28, 2014

Sinceridade



Sinceridade

Ele estava bem de vida e ela estava feliz com ele. Não eram casados, mas viviam bem. Ela gastava um pouco mais do que devia. Ele falou algo a respeito, ela não gostou e tudo continuou do mesmo jeito. Depois, ela começou a exagerar. Comprando futilidades e inutilidades, gastando sem moderação.
Era hora de agir, ele sabia quando algo estava ficando perigoso. Explicou que, daquele jeito, não dava. Era melhor ela arrumar as malas. Terminou o sermão dizendo que ele a amava, mas, naquele momento, amava mais o dinheiro que havia juntado do que a ela mesmo. Foi direto ao ponto.
Ela não gostou, mas sabia que era o fim. Preparou as malas, com tudo que havia comprado. Na hora de sair, porém, advertiu. Ela também. Amava muito mais o dinheiro dele que a ele mesmo. Fez um sinal de desprezo e saiu.

Nada como a sinceridade, mesmo que machuque. 


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Estranhas Histórias
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Monday, October 27, 2014

Moça moderna


Moça moderna


Moça moderna, gosta de festa.  Quase toda noite é uma loucura. Comemorando o que tem de ser comemorado. Depois de beber, precisa dormir. Dormir com quem? Não importa, a noite não é mais criança, mas é cheia de promessas e de “Don Juans”. E assim vai passando a vida de cama em cama, de bebida em bebida. E o dia vem e mais uma noite se aproxima e ela vai se divertir.

Um dia, ela sente algo diferente. De repente, percebe que se apaixonou.  O problema, porém, é que ela não se lembra por quem...


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Sunday, October 26, 2014

In Medio Virtus

"viver é muito perigoso"    "Mas é preciso viver, e viver não é brincadeira não..."
In Medio Virtus

Diretamente do latim “In medio virtus”ou “in medio stat virtus” significa  literalmente, que “a virtude, ou a verdade, está no meio”.  Isto pode parecer conversa mole ou conversa de bêbado, mas, na verdade pode ser a solução para todos os problemas do mundo. Parece simples e fácil, mas é, com certeza, a coisa mais difícil do universo. Foi, tem sido e será. Vamos começar com uma das maiores catástrofes da história: a  Segunda Guerra Mundial. Sejam quais forem os problemas da Alemanha antes da guerra, fazer o que Hitler fez, com certeza não está no centro. É  com certeza radical, acho que de direita. O resultado todos sabem. Alguns anos mais tarde, radicalismo de esquerda: o comunismo tirando a liberdade das pessoas, inclusive de religião e de expressão. Todos sabem os resultados. Em escala menor, outro movimento radical de direita, o Macartismo nos EUA, quantas injustiças fez. E por aí vamos, grupos de esquerda, radicais, matando, soltando bombas, aterrorizando.  De direita, a mesma coisa, talvez com estilos diferentes.  Você quer solucionar um problema, acho que é melhor acabar com tudo... Errado. Vários pequenos problemas, não adianta fazer nada, vamos deixar tudo como está...Errado. Meu Deus, como é difícil ficar no centro, não ser radical. Os romanos, grande civilização, sabiam das coisas e por isso tinham este grande ensinamento.Acho que começaram a cair quando abandonaram este princípio básico.  Pode pensar em qualquer aspecto da vida e esta verdade se aplica. Vamos com calma, vamos analisar os dois lados, balancear...Claro, depois de analisar, pensar e tomar uma decisão, alguém pode vir e falar, com autoridade: Você é um frouxo, não sabe tomar decisões, fica no muro, no MEIO...Não tem jeito. Como diz Guimarães Rosa em seu livro “Grande Sertão: Veredas”, “viver é muito perigoso...”...ou como canta Paulinho da Viola em “Pecado Capital”:  “Mas é preciso viver, e viver não é brincadeira não”...
Definitivamente é algo para se pensar...




Veja e ouça: Paulinho da Viola








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À procura deLucas

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Saturday, October 25, 2014

Coração de menino



Coração de menino

 (ou por que os habitantes da Finlândia não morrem congelados)

O pai estava  explicando para o Fabinho que nem todos os países eram como o Brasil. Alguns lugares eram muito, muito frios. Mostrou como se media a temperatura. O Fabinho fez várias perguntas e o paizão explicava. Zero. Essa era a temperatura em que a água congelava. Isso mesmo, gelo, duro. E ele viu todas aquelas fotos de lagos congelados, carros cobertos. Até rios congelavam. Fabinho estava impressionado. Depois de mais algumas explicações, fez uma pergunta para o pai:
-O senhor falou outro dia que existe muita água no corpo da gente. Como é que a água dentro dessas pessoas que moram nos países que o senhor falou não fica congelada?
O pai pensou um pouquinho e depois falou:
-O que acontece, filhão, é que nós temos um coração e ele está batendo o tempo inteiro. Bate, bate e empurra o sangue pelas artérias, pelas veias. Com isso ele faz o corpo da gente ficar quente. Daí, o frio de fora  não vem para dentro.
Diante da carinha meio interrogativa de Fabinho, ele insistiu:
-Entendeu?
Um pouco hesitante, ele confirmou:
-Acho que sim.
Na verdade, de vez em quando, ele se lembrava da explicação e tentava entender melhor. Ele ainda tinha algumas dúvidas.
O tempo passou e o Fabinho tinha quase se esquecido da história. Sabe, depois chegou aquela fase em que eles estão mais preocupados com as  menininhas do que com países que ficam congelados a maior parte do ano. E naquele começo de ano as coisas estavam ainda mais interessantes. Havia chegado uma menina de uma outra cidade que havia se matriculado na sua escola. Melhor ainda, na sua classe. A Lícia era uma gracinha, tinha um jeitinho que todo mundo notava. O Fabinho, então, notava mais do que todo mundo. Ficava sempre de olho nela.
A Lícia, infelizmente, ainda não o tinha notado. Nem por isso ele desistia, ficava sempre olhando. Um dia, o professor de Ciências fez uma pergunta sobre temperatura. Exatamente uma das  coisas que o pai tinha explicado. Ele levantou a mão e acertou em cima a resposta. Recebeu elogio do professor e tudo mais. Mas tudo isso não foi nada perto do olhar que a Lícia deu para ele na primeira vez que ele foi “conferir” com ela, o que ele sempre fazia. E não foi só um olhar. Foram pelo menos mais três e ainda mais um, de que ele não tinha certeza. Mais do que isso, ela olhava, dava uma risadinha e fazia um comentário com a amiga. O coração do Fabinho começou a acelerar e foi acelerando até o final da aula, quando ela acenou para ele e saiu correndo para casa. Não foi usado termômetro, mas dá para garantir que a temperatura do rosto do garoto tinha alcançado uma altura jamais antes registrada. E o coração, aos pinotes. Foi para casa, pensou nela o dia inteiro.
À noite, quando o pai chegou e veio lhe dar um abraço, ele comentou:
-Sabe pai, quando o senhor explicou por que as pessoas não ficam congeladas nos países frios?
O pai não se lembrava exatamente  pois já explicara tanta coisa para o Fabinho, mas respondeu:
-Sim, meu filho, o que tem? Você se esqueceu? Posso explicar de novo.
-Não, não. Era isso que eu queria falar. Eu entendi tudo. Tudinho.
O pai fez uma cara de satisfação mas na vedade não entendeu bem o que o Fabinho queria dizer. Também, não importava, o Fabinho estava tão feliz! Era isso que importava. 


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Thursday, October 23, 2014

A essência do mal (ou Demônio do Alabama)



A essência do mal (ou o Demônio do Alabama)

Existem os velhos e conhecidos facínoras. Monstros cruéis, assassinos frios, que matam por nada. Muitos são presos, outros morrem e muitos continuam seu caminho para o inferno. Pelo menos, a gente sabe quem são. Há, porém, aqueles que atuam nas sombras. Dissimulam-se com faces inocentes, exercem funções dignas, sabem falar bonito e até falam de Deus. Alguns pregam no púlpito com palavras de homens de bem. Dissimulados, enganam a todos. Alguns fingem amar as crianças e delas abusam. São seres da escuridão, os piores de todos. Outros usam a fé dos inocentes e disseminam o mal.
O Rev. Juan D. McFarland, de Montgomery, Alabama, é um desses. Pastor conhecido, de prestígio, tinha AIDS e, há muito tempo, estava dormido com algumas seguidoras. A parte da ética e da moral, vamos deixar de lado. São todos adultos. O problema que só ele sabia disso e foi infectando inúmeras pessoas de propósito. No final, acabou confessando tudo, lá de cima do púlpito. Confessou também que usava drogas pesadas.
Quando tentaram tirá-lo do cargo, resistiu, colocou cadeados nas dependências, tentou limpar a conta do banco, que nem era dele.
A arrogância da maldade não tem limites. Essas pessoas são a própria essência do mal.




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Estranhas Histórias
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Wednesday, October 22, 2014

Cara de abóbora: Halloween


Cara de abóbora

Halloween está chegando. As lojas já mostram aquelas caras monstruosas, aquelas roupas estranhas, cadáveres, teias de aranhas e outras coisas supostamente assustadoras. Dizem que lá no fundo é para aprendermos a lidar com nossos próprios medos. Obviamente, antes de tudo isso, como bom país capitalista, o objetivo é vender bastante. Por outro lado, fico aqui, pensando. Assustar? Depois de tudo que já vimos só nesse ano? Pessoas sendo decapitadas, e suas imagens sendo espalhadas através de vídeos nos meios de comunicação? Terroristas derrubando avião de passageiros? Loucos assassinos atirando em todo mundo? Grupos extremistas sequestrando dezenas de meninas para serem vendidas como mercadorias comuns? Posso fazer uma lista enorme, vai ser muito fácil.
Por isso, quando olho para aquela abóbora cortada a canivete para fazer uma cara que dá medo, com aquela luz de vela vindo de dentro... Francamente, dá vontade de rir. Porque o mundo de verdade já me fez chorar de medo e susto.

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Monday, October 20, 2014

Um carro cheio de luzinhas



Um carro cheio de luzinhas


Um carro cheio de luzinhas
Juan atravessou a fronteira e entrou nos Estados Unidos. Queria trabalhar e mandar dinheiro para a família. Seu primo Miguel acolheu-o em sua casa, conseguiu arrumar um emprego para ele. Trabalhou duro durante muito tempo. Finalmente tinha o suficiente para comprar um carro “moderno”, como ele dizia. Claro que era usado e tinha muitos anos de vida, mas isso é porque os americanos já faziam carros modernos há muito tempo. Tinha uma boa milhagem também, advertiu seu primo Miguel. Segundo ele, que olhou na internet e tudo mais, com aquelas milhas dava para o automóvel ir para a Lua. E já estaria voltando. Grande coisa, argumentou o Juan. O homem não tinha ido para a Lua também?
O mais bonito mesmo era que aquele carro tinha uma luzinha para cada coisa. Nem precisava de diagnóstico de mecânico nenhum. Além das luzes normais, que indicavam o nível do óleo, as setas, etc., ele tinha outras para problemas que você nem imagina: transmissão, breques, sensor disso, sensor daquilo, tração...Tudo que você possa imaginar. E todo dia uma luzinha acendia. Você sabe como é carro velho. E o Juan ia se virando. Coisa simples, ele mesmo consertava. Um pouco mais complicada, pedia para algum amigo mexicano. Quando não tinha jeito, ia até um mecânico conhecido. Só não dava para ir até uma oficina americana. O que eles cobravam por hora, ninguém aguentava pagar. Se ficasse lá o dia inteiro, nem vendendo o veículo, o dinheiro seria suficiente.
Após algum tempo, algumas luzinhas o Juan deixava de lado. Se era coisa que deixava o carro continuar rodando, ele não consertava. Era até bonito ver aqueles avisos todos lá, piscando. E cada dia havia uma luz nova, além das que já estavam acesas.
Um dia, de manhã, Juan ligou a chave do carro e deu partida. Todas as luzinhas se acenderam de uma vez. Se não fosse pelo susto, até que era bonito. O painel até parecia uma árvore de Natal. Ele acelerou, mas o motor fez um barulho esquisito, e depois parou. Todas aquelas luzes piscaram de novo, todas de uma vez, e depois se apagaram. Para sempre.

Foi uma tristeza. O valor do carro, do jeito que estava, mal dava para pagar o guincho que o levou embora. Mas que era um carro bonito e moderno, ah, isso ele era. E era cheio de luzinhas, o danado!

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Sunday, October 19, 2014

Coisas da América ou "Ligações não tão perigosas"





Ligações não tão perigosas

Rosângela era casada com Ron, que era Americano, e portanto tinha seus documentos em ordem, estava legal no país, o que é, sem querer fazer trocadilho, muito “legal”. Do outro lado da rua morava Juanita, uma dominicana que era casada com Carlos, um cubano. Você sabe que para os cubanos é muito fácil arrumar os papeis de imigração e foi por isso que Juanita também estava legal no país através do casamento. Juanita, logo que chegara aqui tinha ficado amiga de Dolores, que havia apresentado Carlos para ela. 
Dolores também tinha os documentos em ordem pois havia se casado com Pete, um americano que era filho de uma mexicana com um americano e portanto cidadão americano, o que tinha feito dela também uma cidadã, por matrimônio. Embora Pete tivesse nascido aqui, ele tinha muitos amigos mexicanos, legais ou não, uma vez que sua mãe, como eu disse, era mexicana de origem. Assim sendo, Pete era amigo de Lorenzo, Esteban, Cristiano, Ramiro, Consuelo, Carmen. Esta última, Carmen, também era casada com um americano há muito tempo. Nunca tinha precisado trabalhar e de repente, precisou. Foi aí então que descobriu, a duras penas, que mesmo sendo casado com um americano, a cidadania não era automática, era preciso pedir oficialmente. Estava acertando os papéis, mas enquanto isso precisou pegar um serviço “por fora”, daqueles que não exigem “papeles”, ou seja documentos que provem que você está no país legalmente. 
Foi nesse emprego provisório que ela encontrou Margarida que se tornou uma grande amiga. Margarida é brasileira e você já deve ter percebido, não tem documentos, pois se não fosse assim não estaria trabalhando nessa empresa que não pede documentos. Vejam só que coincidência, Margarida acabou ficando amiga da Rosângela, aquela do começo da história que também é brasileira, mas que tem documentos, e portanto é legal. Não que Margarida não o seja, muito pelo contrário, é muito “legal”, só não o é em termos de leis de imigração americana. E mesmo em termos de lei ela é legal do ponto de vista do Brasil. Os mexicanos também são todos legais do ponto de vista do México. Você já percebeu que “legalidade” é uma questão de ponto de vista.  Mesmo ser “legal” no outro sentido é relativo. Existem pessoas que acham você "legal" e outros não. Quero dizer, aqui nos Estados Unidos, você pode ser “cool” ou não. Depende do ponto de vista do outro que convive com você. Por falar nisso, aqui nos EUA, não dá para brincar com a palavra “legal”, como estou fazendo em Português, porque o significado dela é só “estar dentro da lei” não tem nada a ver com  “legal”  no sentido de “bacana”. Por isso que eles têm a palavra “cool”. Ser “cool”não é necessariamente ser legal por aqui, por isso muito cuidado...Voltando à Rosângela, ela ficou amiga da Margarida na igreja. Isso mesmo, elas frequentam a mesma. Consequentemente têm o mesmo pastor, o pastor Antônio, que por sinal é legal, nos dois sentidos. Tem “green card”, conseguido através de sua igreja, graças a Deus! Um dia  Margarida também vai conseguir um “green card”, amém!













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Thursday, October 16, 2014

Es una eternidad


Es una eternidad

Era o mês de março de 1986 e eu tinha acabado de ganhar uma passagem de cortesia para Santiago do Chile. Não se pode perder uma oportunidade como essa. Lá fomos eu e minha esposa conhecer a famosa cidade chilena. Após desarrumarmos as malas, saímos do hotel e pegamos um táxi para darmos uma volta e, assim, conhecermos o centro e arredores.
Um ano antes, em 3 de março de 1985, um terremoto de 7.7 graus na escala Richter tinha assolado a região, matando dezenas de pessoas e ferindo centenas. Mais de um milhão de edificações destruídas. O motorista ofereceu-se para ser nosso guia turístico e começou a explicar os pontos históricos e culturais. Logo no segundo quarteirão, entretanto, vimos um enorme racho num edifício. Imediatamente perguntamos o óbvio. Aquilo? Tinha sido o terremoto? Claro que sim, ele afirmou. Aquilo não era nada.
Com nosso “portunhol” pedimos que ele explicasse mais. Onde ele estava, o que havia sentido? Gesticulando muito, disse que parecia o final do mundo. Era como se o chão estivesse sumindo sob os pés. Um pânico indescritível.
-E quanto tempo demorou isso tudo?
Ele, segurando firme a direção, como se o terremoto ainda estivesse ativo, olhou para trás e mostrou dois dedos.
-Dois segundos?
Achamos muito rápido, é claro. Principalmente se considerarmos toda aquela destruição. Ele confirmou, sim, dois segundos.
Quase sem pensar, falei o que veio à cabeça:
-Dois segundos? Só isso?
Ele olhou para trás, olhos esbugalhados, e falou em espanhol simples e claro:

-“Es uma eternidad...”

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Wednesday, October 15, 2014

O professor de português


O professor de português


Contaram essa história para mim, não sei se é verdade. Existem coisas que a gente nunca sabe, como o caso do céu e do inferno. Podemos acreditar e ter fé, mas certeza matemática ninguém tem. Também que graça teria se a gente tivesse certeza, daí seria informação, não seria fé. Mas voltando à história. Era uma vez  professor de português... Sempre houve tantos, até eu fui um certa vez, mas esse era diferente. Quando ainda era bem jovem, ele dava umas aulas de literatura brasileira para uma classe do antigo curso "colegial". Ele adorava aquela turma, eles eram interessadíssimos. Faziam aquelas perguntas que o o obrigavam a pensar e se inspirar. Foi então que resolveu escrever um poema sobre o amor. Que ousadia, com tanta gente importante no “mercado”, chegava a ser arrogância. Ainda bem que o Drummond, o Bandeira, a Cecília e todos aqueles “deuses” já estavam mortos, que Deus me perdoe, porque não queria nem pensar se eles soubessem o que ele, um mero “ensinador” estava tentando.
Depois de corrigir aquele montão de provas todos os dias e preparar as aulas, ele começava a escrever. Depois de algum tempo, lia em voz alta para ver como estava. Daí corrigia com muito mais fúria do que quando corrigia as provas de seus alunos. Era exigente consigo mesmo. Refazia aqui e ali, aumentava e diminuía, colocava um sinônimo.  Pensava consigo mesmo que rima era uma coisa boa e bonita, fazia o poema ficar musical e gracioso. Por outro lado, às vezes distorcia o que queria dizer. Era uma luta cruel, mas ele continuava.  Demorou anos e finalmente terminou a sua criação. Não ousou mostrar para ninguém. Resolveu ficar um bom tempo sem olhar para o poema, pois quando o fizesse novamente, faria a leitura com outros olhos e certamente encontraria algum defeito, algo que pudesse melhorar. E assim fez e, de fato, mudou um monte de coisas. Achou palavras melhores aqui e ali, refez versos, até que ele ficou bom. Fez isso inúmeras vezes, cada vez melhorava mais. Sabe, a experiência da vida, as coisas que ouvia e via, tudo ajudava. Sem contar a sua linda esposa que sempre o inspirava. Entretanto, nem para ela, ele queria mostrar a sua poesia. Quando resolvesse ler para alguém (  imagina, publicar nem passava pela cabeça)  teria de ser pelo menos uma coisa extraordinária, porque perfeição não existe. Pois bem, ele foi ficando velhinho, se aposentou e tinha todo o tempo do mundo. Conseguiu ainda melhorar mais o seu escrito. Até que um dia resolveu parar. Tudo tem um limite e aquele era seu limite, nunca seria um poeta, poeta...Talvez um pequeno poeta, um poeta menor. A palavra “poetinha” chegou a passar pela sua cabeça, mas daí se lembrou do Vinícius. Que arrogância, alguém poderia pensar que ele quisesse se comparar, que absurdo!
Nunca mais mexeu no poema. Um dia sentiu uma dor no peito e teve de ser internado. Mais uns dias e, pobre do professor, morreu sem ler para nuinguém a sua pequena obra. A sua vida acabou, o poema acabou e nunca ninguém viu, leu ou ouviu...
Ele, o professor, tinha alguns defeitos, não era um santo. Mas certamente não era mau,. Quem escreve poesia não pode ser um mau sujeito. O fato é que o Criador o chamou para o céu. Ficou um pouco surpreso, pois embora acreditasse em coisas espirituais, do céu ele não tinha muita certeza. Foi entrando e pensou em pedir licença, mas não pediu porque se lembrou do Manuel Bandeira, embora ele não fosse a Irene: essa ele já tinha aprendido. Por falar no Bandeira, lá estava ele, sentado numa poltrona celestial e, ao lado, nada mais, nada menos, do que o Drummond, a Cecília, os Mários (de Andrade e o Quintana), e a Clarice. Havia muitos outros mas a emoção era tanta que ele nem conseguia reconhecer. Pensou que era a secção dos poetas e chegou a ficar emocionado de ir parar nessa repartição. Mas era mais do que isso. Estavam todos lá para ouvir a leitura do poema. Pelo menos, foi o que a Clarice falou para ele. Não podia acreditar. Meu Deus! Por falar nEle, quis perguntar mas nem precisou, o Quintana explicou que ele estava ouvindo, mas só iria falar com ele, o poeta professor, depois de ouvir a leitura. Imaginem, nem Ele, que sabe tudo, quis olhar o poema antes, sem a permissão do professor. Finalmente perdeu a vergonha e resolveu ler o poema. Ler? Quem precisava ler?  Ele havia repassado aqueles versos tantas vezes, tinha tudo na ponta da língua. Recitou com emoção, estava quase chorando. Ajudou na emoção o fato de que, além de estar ali, ele se lembrou da sua amada, que foi sempre sua inspiração. Quando terminou, todos bateram palmas, em pé. Ele era muito humilde e sabia que aquele poeminha não era nada. Com certeza eles aplaudiram porque, afinal, ele havia sido recomendado pelo próprio Criador, que consegue ver beleza em tudo, pois foi ele mesmo que a criou.
O texto eu não conheço, ainda não fui para o paraíso. Se a história é verdade eu também não posso garantir. Como disse, ninguém pode. Eu só contei aqui porque acho que é uma história bonita e bem que podia ser verdade. Além disso, se bastante gente ler, ela acaba virando verdadeira. Acontece até com novelas de televisão... 


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