Tuesday, May 15, 2012


A Maratona de Ryan

Ryan Adams era um senhor respeitável, educado e extremamente saudável, principalmente se considerarmos que estava com 73. Poderia ter se aposentado há mais de 15 anos atrás, mas preferiu continuar trabalhando. “Fazer o que em casa?”, perguntava.
Sam era relativamente jovem, tinha apenas 32. Bom sujeito, extrovertido, brincava com todos. Tinha um pequeno defeito, porém. Estava sempre fazendo observações sobre os colegas e sempre na frente de todos. Não eram maldosas mas às vezes incomodavam um pouco. Era um grande hotel e havia muitos funcionários. Ora Sam fazia uma brincadeira sobre a gravata do recepcionista, outras vezes sobre a maneira como o rapaz do estacionamento corria para pegar o carro do hóspede ou ainda sobre o novo penteado da moça da limpeza. Como disse, nada pesado, mas não deixava passar nada. Tinha sempre uma observação. Às vezes vinha disfarçada em forma de elogio, as vezes não tinha disfarce nenhum. Apesar da diferença de idade, Sam não perdoava nem o Ryan. Sempre alguma coisa a respeito da idade, da aposentadoria ou algo assim. Com o Ryan, Sam disfarçava bem, sempre vinha em forma de elogio. Ryan, no entanto, era experiente, já tinha vivido muito e certamente sabia ler nas entrelinhas. Não só isso, sabia ler antes e depois da linha. Sábio que era, nunca retrucava, embora tivesse pelo menos três ou quarto respostas que aniquilariam a piada do colega de trabalho. Mas fazer isto não era seu tipo e por isso apenas dava um pequeno sorriso, educado, mas que para um bom leitor de expressões faciais, significava muita coisa.
Um dia houve uma maratona organizada pela empresa que administrava o hotel. Qualquer um podia participar: hóspedes, funcionários, qualquer atleta que viesse de qualquer lugar. Chega o dia esperado e Sam, que também gostava de se exibir, resolveu participar da mesma. É dada a partida e Sam começa com tudo. Antes de completar o primeiro quilômetro, entretanto, começa a fraquejar, o coração parece que vai explodir e, sábia e dissimuladamente abandona a corrida.  Espera, claro, que nenhum colega tenha visto pois não tinha vontade de ouvir uma “gracinha” igual às que ele mesmo fazia. Encontra uma área de descanso onde pode sentar-se e tomar um refrigerante. Precisa passar um bom tempo lá para que nenhum colega seu perceba o fiasco.
Depois de mais de duas horas e meia, tempo que Sam precisou “matar”, começam a chegar os primeiros maratonistas, aqueles com os melhores tempos. Muita conversa e animação, pessoas se cumprimentando, se abraçando. De repente, para surpresa de Sam, entra o Ryan, todo lépido, de tênis e tudo mais. Senta-se e pede uma água gelada. Será que ele correu? 73 anos? Não pode ser…Ele é um velhinho.  Sam começa a ficar preocupado com todas as piadas que fizera. Quando percebe, Ryan está acenando para ele. A seu lado, uma linda mulher também está sorrindo. Não havia outro jeito senão se aproximar. Após as introduções de praxe, Jessica explica que “Papai fez um bom tempo mas está chateado pois sempre fica entre os primeiros 50 e desta vez ficou entre os cem”. Diante da estupefação de Sam, ela explica: “Existe uma boa explicação para isso…”  e continua: “Papai estava deprimido  porque a direção do hotel não o liberou para a maratona de Boston no próximo mês, onde ele sempre consegue uma boa marca. Papai correu a vida inteira.”, finaliza a orgulhosa filha.
Sam estava aturdido, envergonhado, mudo de vergonha. O “velhinho” era um sério corredor de maratonas. E ele? Um gozador barato que mal conseguiu dar as primeiras passadas na corrida. Nem se lembra do que falou para a exuberante Jéssica, deu algumas desculpas esfarrapadas e foi para a casa. E pensou, pensou…
Sam praticamente parou de fazer piadas. Com certeza nunca mais fez nenhuma sobre o Ryan, pai de Jéssica, o grande maratonista, o grande atleta, etc, etc…
A história é verdadeira e até pensei em um grande pensamento para o desfecho, mas acho que não precisa, os fatos falam por si mesmos…ou talvez melhor dizendo “calam por si mesmos”?

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