Ao
pé da letra
O
Godofredo chegava a ser chato com sua mania de levar tudo ali, em cima, sem
margem para nada. Era detalhista a um ponto que irritava. Você não podia deixar
nada em aberto, nada liberado para a imaginação. As coisas tinham de ser definidas,
enquadradas, estabelecidas.
Nós
trabalhávamos juntos e um dia precisei repassar para ele uma ordem de meu chefe.
Precisávamos melhorar as vendas, precisávamos ser criativos. Dei algumas
sugestões, apelei para sua criatividade.
Foi
aí que ele ficou desesperado e começou a fazer um monte de perguntas.
Precisava de detalhes, precisava de mais
explicação. Então desisti e falei:
-Godofredo,
você não pode querer entender tudo ao pé
da letra. Existem coisas que só se sugerem, você precisa criar em cima disso.
Você precisa inventar, imaginar...
Percebi
então que ele estava se desesperando e parece que o ouvi murmurar:
-Ao
pé da letra...
Entendi
o que se passava em sua mente. Quase podia ver. O Godofredo tinha colocado em
sua tela mental todas as palavras que eu tinha dito. Daí pôs um pezinho
imaginário em cada letra de cada palavra. Imagino até os pezinhos se mexendo e
ele observando. Ele estava realmente levando as minhas palavras ao pé da letra.
E eu que pensei que letras não tinham pé, a não ser no mundo metafórico. Coitado
do Godofredo.
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