A
parede de vidro
O Silas acordou assustado naquela manhã do verão de
1994. Nem ele sabia por quê. Logo notou que a Jaci não estava na cama, já havia
se levantado. Reparou então que havia um bilhete pendurado no abajur. Lá dizia
que tinha ido fazer compras, voltava em uma hora.
Silas foi até o banheiro e depois resolveu dar uma
volta pela casa. Sentiu que estava meio abafado e então foi até a porta da
frente. Abriu-a e teve uma grande surpresa. Uma espécie de parede de vidro
fechava toda a entrada. Tinha cerca de 20 centímetros de grossura, mas era
transparente e podia se ver tudo lá fora. Passados os primeiros segundos de
espanto, ele correu para a janela e escancarou as cortinas. Mesma coisa. O
mesmo tinha acontecido com todas as outras janelas.
Ele pensou então em pegar o telefone, mas notou que
ele estava mudo e também que não havia eletricidade e água na torneira. Abriu a
geladeira e percebeu que o gelo começava a derreter. Havia suco na jarra,
entretanto. Tomou alguns goles e foi novamente para a porta da frente.
Talvez aquilo tudo fosse uma ilusão e agora já tivesse passado. Sonho não era,
ele sabia. Foi a primeira coisa que ele pensou. Além disso, lembrou-se muito
bem de ter acordado e depois ter ido para a sala.
Nada havia mudado. Aquela muralha de vidro ou acrílico
ainda estava lá, intransigente. Foi aí que notou o carro da Jaci estacionado na
frente da casa. Logo a seguir, percebeu que ela estava andando em direção à
porta. Ela ainda não havia notado a parede de vidro e com uma das mãos – a
outra segurava uma sacola com compras – procurava a chave da porta. Começou a
gritar para ela – não que ela fosse ouvir – em desespero. Quando ela estava bem
perto, bem perto mesmo, viu dois vultos virem por trás dela e um deles tocou em
seu ombro. Eles eram, na verdade, dois policiais, seguraram-na pelos braços,
delicadamente, assim que ela se virou. Ela não resistiu e os acompanhou.
O desespero do Silas aumentou. Algo, lá dentro de sua
cabeça, dizia que aquilo era permanente, definitivo. Tentou, por alguns
segundos, relacionar o que estava acontecendo dentro de casa e o fato de
levarem sua mulher embora. Sabia que, por mais que pensasse, não iria achar uma
explicação. Estranhamente, o vidro estava se tornando opaco e mal se conseguia
ver o lado de fora.
Apesar da situação, decidiu que devia sentar um
pouco no sofá da sala. De repente, pareceu óbvio para ele. Precisava tomar um
remédio. Era uma coisa boba, mas pensou que era bom que havia suco na
geladeira, pois assim era mais fácil engolir. Ele já tinha tomado remédio antes
por motivo semelhante. Um momento, será que isso já aconteceu uma vez? Não,
certamente não. Ele estava tão assustado que estava se confundindo. Sabia que
tinha que tomar uma bela dose. Um ou dois comprimidos não iriam resolver. Tomou
vários. Não demorou muito e começou a ficar sonolento. Ao mesmo tempo, começou
a adquirir a certeza de que o problema iria embora. O que ele não entendia
direito era se o remédio fazia com que ele dormisse ou se o remédio de alguma
forma fazia a parede de vidro desaparecer. Isso não pode ser. Será?
Foi acordando devagar. Luz branca de hospital lá no
teto. Vozes. Está numa cama e não tem forças. Alguém lhe pergunta algo, mas ele
não consegue responder.
Silas dormiu mais e mais. De repente, parecia estar
sonhando. Começou a falar de uma parede de vidro. Gritava para que não levassem
a Jaci embora.
Alguém lhe falou alguma coisa, tentando acalmá-lo.
Ele, porém, não ouviu. Deram-lhe alguns comprimidos e, com jeito, fizeram que
ele os engolisse com a água do copo. Ele foi se acalmando novamente. Parecia
dormir, mais uma vez.
O Silas acordou assustado naquela manhã do verão de
1994. Nem ele sabia por quê. Logo notou que a Jaci não estava na cama, já havia
se levantado. Reparou então que havia um bilhete pendurado no abajur. Lá dizia
que tinha ido fazer compras, voltava em uma hora.
Silas foi até o banheiro e...
À procura de Lucas
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