Framstad,
a cidade do futuro
O projeto “Framstad” foi organizado
pelos maiores cientistas da humanidade a partir do ano 2276. Foram mais de 20
anos de estudo, considerações, planejamento e testes. Finalmente o primeiro
modelo estava funcionando.
Três mil pessoas, de idades
diferentes, foram escolhidas para habitar Framstad, a cidade do futuro. A
diversidade dos habitantes era propositalmente enorme. Nenhum detalhe foi
deixado de fora.
O local era secreto e todo o
funcionamento era controlado a partir do Centro de Inteligência Artificial. A
quase totalidade das decisões sobre o funcionamento e o dia a dia da cidade era
feita pelas máquinas inteligentes. Entretanto, um “conselho especial”, formado
por homens da ciência, supervisionava essas decisões.
O principal objetivo do projeto era
preparar a maneira de vida para a Terra em 500 anos. Era um modelo de cidade do
futuro. Com tudo feito dentro da mais alta tecnologia e por IA, pouco havia a
se acrescentar. No entanto, nos últimos anos, o professor Brysig insistiu, em
oposição à inteligência das máquinas, que deveria haver um componente mais
humano, algo que desse uma certa carcterística de “incerteza” no funcionamento
daquela comunidade especial. Ele achava que, do jeito que estava, aquilo
parecia mais uma espécie de jogo virtual, algo muito artificial. Depois de
muita luta, conseguiu que sete elementos, habitantes da cidade, fossem
programados para serem inovadores, humanistas, verdadeiros rebeldes. Eles
seriam os “Upprormen”. Era uma espécie
de válvula, ou uma espécie de contraponto, para aquilo que o professor Brysig
estava chamando de “cidade de gelo”.
Depois de cinco meses de
funcionamento, os “controladores” humanos da cidade, começaram a notar alguns
problemas causados pelos “Upprormen”.
Entre outros tumultos, tentaram sair do perímetro sem autorização. A
respeito disso, deve se notar, que era raro alguém precisar sair da cidade. Em
primeiro lugar, era praticamente impossível alguém precisar de algo de fora,
uma vez que a “cidade perfeita” tinha de tudo. Em segundo lugar, era muito
complicado sair. Era permitido, entretanto, pois não se queria criar a ideia de
que estavam numa prisão. Quando um raro habitante manifestava desejo para
deixar momentaneamente o local, tinha de passar por um portal e passar por diversos
exames.
Estranhamente, todos que voltavam
dessas “viagens” não se sentiam muito bem, não gostavam da experiência e
evitavam falar sobre elas. Cada vez mais os habitantes evitavam pedir
autorização para saída. Para os “Upprormen” estava óbvio que alguma coisa
estava errada e, eles, como grupo de controle, não estavam satisfeitos. Estavam
muito desconfiados dos controles que eram feitos nas pessoas que saíam e
entravam. Por isso estavam exigindo sair sem esse controle.
Estava criado um impasse. A IA dizia
que, de acordo com a estrutura do projeto, sair sem controle era impossível.
Para o professor Brysig e alguns de seus seguidores, esse era exatamente o
propósito dos “Upprormen”, ou seja, contestar o projeto, descobrir o que não
estava bem. Estavam criando uma cidade do futuro, não uma cidade autômatos.
Algum tempo depois dos primeiros
confrontos entre o professor Brysig e a IA, aconteceu o que jamais poderia
acontecer numa cidade perfeita, Três dos 7 “Upprormen” haviam sido “teminados”.
Três outros pareciam ter desistido completamente de sair, porém estava claro
que sua parte psíquica não estava bem. O último dos “Upprormen”,
Edward,continuava lutando para sair sem controle e claramente denunciava a
administração da cidade por estar “boicotando” os “Uppprormen”. O “conselho” se
reuniu várias vezes, o que não deveria acontecer, pois tudo estava previsto,
nada mais deveria ser discutido. A discussão era sempre a mesma. A IA tinha “desabilitado” propositadamente os
“Upprormen” , era o que o professor Brysig dizia e aquilo era uma reação normal
do sistema contra elementos perigosos para uma comunidade, diziam os que
apoiavam a administração feita pelas máquinas.
Brysig tinha um segredo. Ele tinha
pessoalmente programado “Edward”, o último dos “Upprormen”. Ele era controlado
apenas em parte pela IA. Uma parte dele tinha capacidade de tomar decisões
próprias, além de conhecer detalhes do projeto que nenhum outro habitante
conhecia.
Como todos suspeitavam no mundo
científico, bem como na população em geral, a “Framstad” ficava mesmo no
deserto de Chihuahuan. Mesmo que você chegasse bem perto, entretanto, você
veria pouca coisa. Tudo que se destacava
na paisagem era um só e grande edifício: a administração da cidade. No subsolo
é que estava todas a população, Clones humanos cuidadosamente guardados em
cápsulas devidamente monitoradas e ligadas a um sistema central. As
consciências dos clones eram reais e eles viam e sentiam tudo que se passava.
Eles tinham uma vida virtual, perfeita e programada. Felicidade, bem-estar,
tudo que um ser humano poderia desejar. Se funcionasse, os seres humanos
normais iriam usar o sistema mais tarde. Para que ter um corpo humano,
perecível, que envelhece, com todos os riscos que vêm junto? Os clones que
tentavam “virtualmente” sair da cidade, tinham de passar pelo portal, também
“virtual” e lá era reprogramados para não terem mais vontade de sair. Um clone
nunca poderia fisicamente sair da cápsula, pois estava preso a ela, de fato.
Edward, porém, era diferente. O professor Brysig tinha conseguido deixá-lo
livre, embora dentro da cápsula, caso quisesse se liberar do sistema. Ele tinha
um controle dentro da cápsula para isso. Além disso, parte do tempo, a
consciência de Edward era real e ele podia ter uma melhor visão da realidade,
podendo tomar decisões nos dois mundos, no real e no virtual. Inicialmente
professor Brysig tinha pensado em deixar todos os “Upprormen” na mesma situação
que Edward, mas achou que ele ia ser descoberto muito cedo e não conseguiria
provar seu ponto de vista.
Foi durante uma das grandes reuniões
do conselho que o alarme soou. Tinha havido uma brecha de segurança no sistema.
Algum clone tinha saído do subsolo, do imenso “depósito” de clones. Antes mesmo
que se levantassem de seus assentos, entrou pela porta principal, nada mais
nada menos do que Edward, nu, arrastando consigo alguns dos terminais que
haviam sido ligados a seu corpo.
Brysig levantou-se, pôs as mãos em
suas costas e levou-o para o laboratório. Era o que Brysig queria provar. O
único elemento que tinha chance de sair por vontade própria, o fez. Existia
algo de errado na concepção do sistema. Felicidade e bem-estar total não era a
única coisa importante. Mesmo um clone, geneticamente preparado para aceitar
este tipo de vida, tinha se rebelado, precisava de um mínimo de liberdade, de
autodeterminação.
Brysig, por sua coragem e
determinismo, conseguiu redirecionar o destino da humanidade. O futuro iria
continuar a ser planejado e finalmente viria a se tornar virtual em grande
parte, mas não tão já e não em escala total.
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