Antigas
sintonias e sonhos de uma nova era
Examinava com atenção aquelas lâmpadas estranhas, de vários
tamanhos, com aqueles araminhos incandescentes. Tentava descobrir seus segredos
e seus mistérios. Havia também aquele cordão fino que se enrolava em duas
roldanas, uma em cada lado da caixa. E havia outras coisas, enigmáticas,
fascinantes, que eu não conseguia entender. Na frente do aparelho, do lado
direito superior, havia uma pequena circunferência e, dentro dela, havia uma
luzinha verde que escurecia e clareava, alternadamente. Tremeluzia. Na parte de
baixo, um painel de vidro, onde estavam faixas escritas com números e pequenas
letras. Ondas longas, médias, e curtas. E eu olhava lá dentro, excitado,
tentando descobrir seu significado. E aquela caixa falava e cantava. Às vezes,
a voz parecia distante, quase sumia. Ruídos indefinidos, indecifráveis,
se misturavam com as canções que eu ouvia e com os relatos daqueles homens com
timbres graves, vindo de não sei onde.
Esse era o pequeno aparelho de rádio que minha mãe ligava
toda manhã, enquanto arrumava a casa. Era um daqueles bem antigos, como não
existem mais. As lâmpadas estranhas eram as válvulas e as roldanas com um
cordão era o dial das estações. Eu aprendi depois, que as ondas curtas eram
exatamente as que vinham de longe, de outros países, ou de remotos cantos do
Brasil. Sempre tentei entender por que as chamavam de “curtas”. Talvez por
virem da distância, se misturassem com outros ruídos, tentando achar seu caminho
pelos céus, para, depois de longa jornada, aterrissarem ali no nosso pequeno
receptor. Encurtando distâncias?
Era só magia. E não era só isso, havia outras tantas
surpresas para as crianças de nosso tempo. E nossas cabeças viajavam, em
êxtase, por esse mundo fantástico, delicioso, sem fronteiras.
Depois, com o tempo, a vida e os adultos foram nos
explicando como as coisas funcionam. Os segredos sumiram, e tudo ficou claro,
mas ao mesmo tempo insípido e sem vida. Substituíram por plástico a
graciosa madeira envernizada e demitiram aquelas válvulas pomposas. No lugar,
circuitos e placas, sem graça e que mal se podem ver.
Nossos corações e nossas cabeças de adulto ficam agora,
então, procurando esta graça perdida em outras coisas de nossa existência, mas
ela não está mais lá. Ficou perdida para sempre no passado, como um tesouro que
não podemos mais resgatar, e do qual podemos vagamente nos lembrar.
Hoje, vejo meninos e meninas
com tanta explicação para tudo na vida, logo nos primeiros anos da infância.
Sabem de tudo. Será que não lhes estão roubando a oportunidade de descobrir, de
adivinhar? Ou será que é como deve ser? Seriam assim os sonhos e as
sintonias da nova era?
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