Consciência
Quero
lhe contar coisas que você nunca ouviu, coisas de um mundo distante, coisas de
além da vida. Não sei como fazer, não sei se você vai entender. É tudo tão diferente
do que você está pensando, que nem sei como começar. Só para você ter uma ideia
de todo o absurdo que vou lhe apresentar, preciso lhe confessar algo. Eu nem
existo. Pelo menos não existo mais. Como explicar isso? Não dá com o pouco que
você sabe. Precisaria haver mais referências para você poder se guiar. Talvez
ficasse mais fácil se eu lhe disser que não existo mais para mim, mas existo
para você. Ou talvez que é uma questão de tempo, de época. Existo num outro
tempo, que nem é o futuro, nem o passado. Talvez se eu disser que é em outra
dimensão, você vá compreender melhor, mas não é isso exatamente.
Eu
sou a consciência de que você existe. Entendeu bem? Não a consciência sua ou a
minha. A simples e pura consciência de existir. Por falar nisso, existir? Quem
existe? Não fique alarmado com isso. Existe a hipótese de que você também nem
exista. Pode ser que você seja apenas uma projeção da consciência, como eu.
Seria eu me projetando em você e você se projetando em mim, nós dois não
existindo. Coisa de louco? Eu avisei que seria difícil. Eu sei que você está
pensando que sente a vida pulsar em suas veias. Pulsa mesmo? Sei que você está
vendo cores, ouvindo sons, vendo as formas se combinarem em suave harmonia. É
bonito, mas é real? Você não sabe, nem eu. Por que, então estaria eu a falar
tudo isso? Será que estou falando mesmo, ou sou apenas imaginação? Mas as cores
que você vê, os sons que você ouve e as formas que se formam em sua frente,
elas existem? Existir, o que é existir? Talvez ninguém exista, talvez sejamos
fragmentos de uma realidade maior, insignificantes em nós mesmos, apenas
exercendo uma função secundária num outro ser maior, o verdadeiro.
Você
ainda está aí?
Eu
e você, apenas fragmentos, juntos com outros bilhões de outros fragmentos, formando
uma minúscula partícula de um fragmento um pouco maior, parte insignificante e
minúscula, e apenas acessória, de um outro ser maior ainda, uma consciência de
verdade. Seremos apenas uma fração ridiculamente sem importância de uma sinapse
se comunicando com outra? Num imaginário cérebro gigante, enorme, de um
verdadeiro ser? E se esse outro ser também não tiver certeza de sua própria
existência? Uma falsa impressão de uma consciência muito maior. Uma gigantesca,
absurdamente inacreditável falha, multiplicada por milhões da pequena falhas
que somos nós?
Eu
disse que você não ia entender. Eu também não consigo. Na verdade, como você,
nem certeza de que existo, eu tenho. Desculpe-me ter interferido em sua
pretensa existência, se é que você existe realmente...
Eu
sei, é melhor continuar assim, sem pensar em coisas maiores, complicadas.
Não
que o que estou falando, seja verdadeiro. É melhor pensar do jeito que é mais fácil,
isso é.
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