Gêmeos
de Marte
Depois
de mais de 200 anos de trabalho intenso, foi possível tornar Marte habitável. A
essa altura a Genética tinha também alcançado níveis de sofisticação apenas
sonhados em ficção científica. Trinta e cinco anos depois que o primeiro grupo
de humanos foi habitar o planeta, o Conselho de Ciências Genéticas, pôs em
execução o famoso projeto “Brothers in Mars”.
Os objetivos eram diversos, alguns não muito divulgados, mas o mais
óbvio era observar como dois seres muito semelhantes ou mesmo quase iguais,
reagiriam ao longo dos anos e durante seu crescimento, em dois mundos tão
diferentes.
Embora
houvesse tecnologia para criar esses gêmeos em laboratório, as crianças tiveram
gestação normal, no ventre de uma mãe. Haveria mais autenticidade de
resultados. Assim que nasciam, um deles ia para Marte, o outro ficava na Terra.
Lukas
era parte do projeto “BIM”. Sua irmã Karlas, ainda recém-nascida, foi levada
para o outro planeta. Já estavam com 137 anos – a aparência era a mesma de 40
anos no século 20 - e continuavam se
comunicando quase diariamente. A mensagem demorava alguns minutos para chegar,
dependendo da posição dos planetas. Nunca era tédio, sempre era precioso trocar
aqueles momentos e ambos aguardavam com certa ansiedade a parte do dia em que
isso acontecia.
Naquela
tarde Lukas recebeu uma mensagem diferente. Era quase poética. Sua irmã sempre
fora delicada, mas desta vez havia algo de muito especial. Lukas leu-a várias
vezes antes de responder, pois queria fazer algo especial também. Quando estava
olhando os detalhes do “log”, porém, notou algo muito estranho. O horário de
envio e de chegada eram exatamente o mesmo. Ele sempre prestava atenção nesse
detalhe, pois achava interessante saber se Marte estava mais ou menos próximo
da Terra quando ia responder. Lukas deduziu o óbvio: havia alguma falha na
informação, pois os sinais não poderiam chegar a uma velocidade superior à da
luz. Falou com o setor de comunicações. Falaram que iam retornar com uma
resposta.
No
Centro de Comunicações, Albert tinha acabado de comunicar a seu superior o
ocorrido. Ambos sabiam que uma falha na documentação das comunicações era tão
impossível quanto a mensagem ser enviada imediatamente. Albert sempre gostava
de brincar com seu superior em relação à Ciência, pois o mesmo era fanático em
relação ao assunto:
-
E agora, vamos ter uma explicação científica?
Deu
um suave e malicioso sorriso, quase imperceptível. Herbert fingiu que não
percebeu a ironia e respondeu:
-Sempre
há uma explicação...Sempre.
Na
verdade, ambos estavam curiosos. Aquilo, embora pudesse parecer uma coisa
simples, era bastante perturbador. A velocidade em que as mensagens viajavam,
nem se poderia discutir. O erro no “log”, entretanto, não era menos
perturbador, especialmente numa época em que não se ouvia mais falar em
“falhas”, pelo menos nesse setor. Herbert, depois de verificar tudo a seu
alcance no centro de comunicações da Terra, pediu explicações para o mesmo
departamento em Marte. Alguns minutos depois veio a resposta.
Depois
de checarem todos os dados, não conseguiram encontrar nenhuma explicação e por
isso tentaram se comunicar com Karlas, tentando jogar uma luz no assunto,
embora soubessem que ela não acrescentaria nada.
Ao
contrário, ela acrescentou muito, porém não do jeito que eles esperavam. Ela
tinha falecido. O sistema de Inteligência Artificial confirmou ainda, que a
mensagem havia sido enviada uma hora depois de sua morte. Foram acionados
agências superiores para esclarecer o caso. Aliás, a própria IA de comunicações
já havia emitido um “sinal de paradoxo”, primeiro desde sua criação.
Na
Terra, Albert olhava para a expressão de seu chefe, enquanto ele confirmava as
novidades. Chegou a pensar em uma frase inteligente e brincalhona para “lógica científica”. Talvez quebrasse a
tensão que havia no ambiente. Depois achou que Herbert estava muito perturbado
para tolerar uma brincadeira desse tipo. Na verdade, ele mesmo, estava muito
tenso e sabia que, dali para a frente, algo havia mudado substancialmente em
sua vida, um vida dedicada à ciência.
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