O
Ferrugem
Ele sabia que alguma
coisa estava errada. Tinha passado da hora do Ferrugem chegar e nada. Estava
triste sem a presença do amigo. Era sempre uma festa quando ele voltava para
casa. Antes mesmo de entrar, os dois passeavam pela vizinhança, pulavam,
corriam. Só depois iam para dentro e, então, o Ferrugem arrumava seu prato de
comida. Ele mesmo, só ia comer mais tarde.
Naquele dia eram outras
pessoas que chegavam. Gente estranha que ele nunca tinha visto. O coraçãozinho
foi ficando apertado, apertadinho. Tanto que agora já estava até doendo e batia
descompassado. As pessoas falavam, conversavam, gesticulavam, tudo de um jeito
muito estranho. Às vezes olhavam para ele. Alguns chegavam até a apontar em sua direção. A certeza de que o
Ferrugem não iria mais chegar era agora absoluta. Essas coisas ele sabia.
Sentia. O que poderia ter acontecido? Um acidente?
Por fim chegaram duas
pessoas que ele conhecia. Eram primos do Ferrugem. Todo mundo se ajuntou em
volta deles. Depois, alguns foram saindo da roda, uns com as mãos sobre a
cabeça, outros, chorando, alguns soluçando. Eles tinham dado alguma notícia. Aquilo
era muito triste, não dava para aguentar. O Ferrugem morava sozinho e ele era a
sua única companhia. Agora era ele só, mas sabia que não iam deixar que ele
ficasse sozinho. Quem iria alimentá-lo?
Finalmente chegou mais
um carro que fazia um pouco de barulho com o escapamento. Se o dia não fosse
tão triste ele ia responder àquele barulho. Quando percebeu, o Zeca, primo do
Ferrugem, chegou perto dele. Falou algumas coisas que ele não entendeu, passou
a mão pela sua cabeça e depois pegou-o no colo. Imediatamente percebeu que ele
ia ser entregue ao casal que tinha vindo naquele carro barulhento. Ia ser sua
nova casa. No banco de trás, um garoto, alheio à sua dor, ria de alegria e
estava abrindo os braços para ele. Talvez ele fosse um bom ser humano, mas nem
de longe ele era o Ferrugem. Por coincidência ele tinha a mesma cor de cabelo e
as mesmas pintas no rosto.
O garoto abraçou o Rex
com força e mal podia conter a felicidade. O pai explicou que ele tinha de ter
paciência. O Rex gostava muito do Ferrugem, ia demorar para se acostumar com um
novo dono.
-Às vezes cachorro sente
mais do que gente, explicou.
O calor do corpo do
menino aqueceu um pouco o coração do Rex. Ele estava muito triste. Nada ia ser
mais como antes. Ele jamais iria se esquecer do Ferrugem. E o homem tinha
razão, cachorro sente muito mais do que gente...
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