Tuesday, December 17, 2013

Vendedor de papel gomado

Vendedor de papel gomado



Tempos difíceis, tudo era difícil. Difícil arrumar uma vaga no curso colegial, difícil arrumar um emprego, mesmo “vagabundo”. Para quem tinha acabado de sair do seminário, tímido, sem experiência, mais difícil ainda. Mas, chega de choradeira. Foi o que eu fiz: insisti, insisti e consegui uma vaga no curso “clássico” do Colégio Alarico Silveira, no Bom Retiro. Longe,  mas era um lugar garantido. Mas isso de nada adiantaria, se não conseguisse um emprego.
Muitas entrevistas nem chegavam a acontecer. Outras, diante da óbvia falta de experiência, acabam tendo um resultado frustrante. Finalmente, o dono de uma pequena fábrica de papel engomado me contratou. Eu nem sabia o que era isso. Ele me explicou que muitos fabricantes usavam a tal da fita para fechar as caixas com seus produtos. Lista de preços, amostras, lá vou eu de firma em firma. Salário, não havia. Só uma ajuda de custo para condução e a comissão sobre as vendas.
Logo percebi que não ia ser fácil. Não usamos este produto, é necessário marcar entrevista  antecipadamente com o comprador, não estamos interessados, já temos um fornecedor, eram as coisas que eu ouvia a todo momento. Mas a necessidade e a teimosia me fizeram continuar.
Depois de dez dias, finalmente, um dia de graça. Ali, na região do Alto da Lapa, um comprador da General Electric - imaginem – resolveu me atender. Milagres acontecem. Olhou minha lista de preços, experimentou um pedaço de fita de papel gomado na mesa e disse que ia fazer um pequeno pedido, só para experimentar. Se desse certo, compraria bem mais. Fiquei com a vaga sensação de que estava com pena e decidiu dar uma ajuda.
Não conseguia acreditar. Algo excepcional tinha acontecido. Eu não tinha muita noção de quantidade, mas aquele não parecia um pedido pequeno. Era tarde, estava na hora de ir para a escola e eu peguei o ônibus para o Bom Retiro. Mal conseguia prestar atenção nas aulas. Nem mesmo na do meu querido professor de Português,  que, por coincidência, tinha meu mesmo nome.
Em casa, só dormi porque o cansaço era enorme. Dia seguinte, vou confiante até o dono da firma para orgulhosamente exibir meu pedido. Abri  o talão, bem ali na sua frente, destaquei a primeira via e a dispus sobre a sua mesa. Ele olhou, mostrou certa surpresa mas não me cumprimentou. Disse apenas:
-Não dá!
Atônito, repliquei:
-Como assim, não dá?
-Não temos capacidade de produzir isso nem multiplicando o prazo por dez.
Coloquei o talão sobre a mesa, saí sem me despedir, nunca mais voltei. Fiz questão de me esquecer do nome e do endereço da empresa. Teria terminado ali, precocemente, a carreira de um grande empresário de embalagens?  Não sei, duvido....

A vida é assim, falo por mim, como falava, naquela época, o Roberto Carlos em uma de suas canções...

o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o0o


Essa vida da gente

Para adquirir este livro no Brasil 

--------------------

Para adquirir este livro nos Estados Unidos 

No comments:

Post a Comment