Saturday, December 7, 2013

Ficante pão

Ficante pão



Não sei se é verdade, ainda não verifiquei pessoalmente. Dizem que há uma nova palavra na praça: “ficante”. Como professor, imediatamente deduzi que é derivada do verbo “ficar”, significando aquele “que fica”. Obviamente todos já sabíamos que os jovens estavam usando “ficar” há algum tempo, não em seu sentido tradicional, mas no sentido de “ficar com alguém, por algum tempo, sem compromisso, sem maiores intenções”. Que diferença brutal , há algumas décadas atrás, nem se pensava em uma coisa dessas. Para “ficar” com alguém, suas “intenções” tinham de estar bem claras. Quem não se lembra da famosa pergunta que o pai da moça fazia assim que se começava um namoro:  “Quais são suas intenções com minha filha?“
Águas passadas, todo mundo pensa diferente agora. A ciência muda, a natureza muda, tudo muda, por que o relacionamento das pessoas não mudaria? E, com ele, as palavras. O fato de, recentemente  formarmos o substantivo “ficante” do verbo  ficar, provavelmente indica que o estranho vocábulo tenha vindo para “ficar”, sem querer abusar de trocadilhos.
Pode ser também que, daqui a algumas décadas, não exista mais namoro, noivado ou casamento. Talvez todos sejam “confeccionados” em laboratório e as pessoas não vejam graça em “ficar” também. Quem sabe, “fiquem” ligadas apenas na rede: muita gente já está assim, não está? Pode ser que o que hoje é “ficar”, no futuro próximo seja somente “conectar” em sentido figurado e o “ficante” seja apenas o seu “paquera”....Oops, acha que “paquera” também já não existe mais, ou existe? Na verdade, eu quis dizer “conectante”.
Fiquei tanto na palavra “ficar” que estava me esquecendo da outra palavra sobre a qual queria falar: “pão”. Talvez você não saiba, mas há muitos anos atrás, se as garotas achassem que você era “bonitão” ou, pelo menos “engraçadinho” ou “atraente”, elas iriam chamá-lo de “pão”. Era muito comum, numa rodinha, elas comentarem sobre alguém: “Ele é um pão.” 
Não mais, não mais...
Foi por isso que pensei, como experiência linguística, que alguém pudesse usar uma expressão híbrida ( em termos temporais, é claro) “Meu ficante é um pão”. Na mesma frase, duas expressões separadas por décadas. Acho, porém,  que elas nunca vão aparecer juntas. A não ser que, uma moça, viajante do tempo, de repente jogada no nosso meio social e  ainda meio atrapalhada com o uso da gíria atual, faça uma combinação dessas.
 Não, acho que não...Acho que os “pães” não “ficam” mais e, igualmente, o “ficante” não é mais chamado de “pão”. Assim, posso garantir, “ ficante pão” é, definitivamente, um paradoxo.


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Paralelo 38 e outras histórias
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