Coração de menino
(ou
por que os habitantes da Finlândia não morrem congelados)
O pai
estava explicando para o Fabinho que nem
todos os países eram como o Brasil. Alguns lugares eram muito, muito frios.
Mostrou como se media a temperatura. O Fabinho fez várias perguntas e o paizão
explicava. Zero. Essa era a temperatura em que a água congelava. Isso mesmo,
gelo, duro. E ele viu todas aquelas fotos de lagos congelados, carros cobertos.
Até rios congelavam. Fabinho estava impressionado. Depois de mais algumas
explicações, fez uma pergunta para o pai:
-O
senhor falou outro dia que existe muita água no corpo da gente. Como é que a
água dentro dessas pessoas que moram nos países que o senhor falou não fica
congelada?
O pai
pensou um pouquinho e depois falou:
-O
que acontece, filhão, é que nós temos um coração e ele está batendo o tempo
inteiro. Bate, bate e empurra o sangue pelas artérias, pelas veias. Com isso
ele faz o corpo da gente ficar quente. Daí, o frio de fora não vem para dentro.
Diante
da carinha meio interrogativa de Fabinho, ele insistiu:
-Entendeu?
Um
pouco hesitante, ele confirmou:
-Acho
que sim.
Na
verdade, de vez em quando, ele se lembrava da explicação e tentava entender
melhor. Ele ainda tinha algumas dúvidas.
O
tempo passou e o Fabinho tinha quase se esquecido da história. Sabe, depois chegou
aquela fase em que eles estão mais preocupados com as menininhas do que com países que ficam
congelados a maior parte do ano. E naquele começo de ano as coisas estavam
ainda mais interessantes. Havia chegado uma menina de uma outra cidade que
havia se matriculado na sua escola. Melhor ainda, na sua classe. A Lícia era
uma gracinha, tinha um jeitinho que todo mundo notava. O Fabinho, então, notava
mais do que todo mundo. Ficava sempre de olho nela.
A
Lícia, infelizmente, ainda não o tinha notado. Nem por isso ele desistia,
ficava sempre olhando. Um dia, o professor de Ciências fez uma pergunta sobre
temperatura. Exatamente uma das coisas
que o pai tinha explicado. Ele levantou a mão e acertou em cima a resposta.
Recebeu elogio do professor e tudo mais. Mas tudo isso não foi nada perto do
olhar que a Lícia deu para ele na primeira vez que ele foi “conferir” com ela,
o que ele sempre fazia. E não foi só um olhar. Foram pelo menos mais três e ainda
mais um, de que ele não tinha certeza. Mais do que isso, ela olhava, dava uma
risadinha e fazia um comentário com a amiga. O coração do Fabinho começou a
acelerar e foi acelerando até o final da aula, quando ela acenou para ele e
saiu correndo para casa. Não foi usado termômetro, mas dá para garantir que a
temperatura do rosto do garoto tinha alcançado uma altura jamais antes
registrada. E o coração, aos pinotes. Foi para casa, pensou nela o dia inteiro.
À noite, quando o pai chegou e veio lhe dar um abraço, ele comentou:
À noite, quando o pai chegou e veio lhe dar um abraço, ele comentou:
-Sabe pai, quando o senhor explicou por que as pessoas
não ficam congeladas nos países frios?
O pai não se lembrava exatamente pois já explicara tanta coisa para o Fabinho, mas respondeu:
O pai não se lembrava exatamente pois já explicara tanta coisa para o Fabinho, mas respondeu:
-Sim, meu filho, o que tem? Você se esqueceu? Posso
explicar de novo.
-Não, não. Era isso que eu queria falar. Eu entendi
tudo. Tudinho.
O pai fez uma cara de satisfação mas na vedade não
entendeu bem o que o Fabinho queria dizer. Também, não importava, o Fabinho
estava tão feliz! Era isso que importava.
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Essa vida da gente
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