A
felicidade pairando no ar
A
felicidade estava à solta, por aí. Precisava, como os espíritos, de um corpo
para se encostar. Tentou, primeiro, um engenheiro. Ele, porém, estava cheio de
projetos, concretos, tinha de terminar. O médico, igualmente, estava naquela
rotina sem fim: consultório, hospital, consultório. Às vezes, no meio, uma
emergência. O advogado estava cheio de defesas para fazer e de processos para
protocolar. Era como processava a vida. Uma mãe dedicada, essa sim, era uma
candidata perfeita. Qual o quê! Estava tão preocupada com a felicidade dos
filhos, em tanto lugar a procurava, que nem percebeu quando a verdadeira se
aproximou. Ironia total: os filhos, aborrecidos com a chateação da mãe, aquela
insana missão de fazê-los felizes, que nem se deram conta quando aquela alegria
enorme passou bem perto, quase os atropelou.
Faltava
o poeta, esse não podia falhar! A felicidade foi chegando perto de sua criadora
imaginação para cutucar. Mas, ao lá chegar, se assustou. Estava cheia de
problemas para contar. Histórias tristes ele tinha demais para poetar. Casos de
depressão para transformar em rimas transversais. Até uma imaginária nota de
suicídio tinha de escrever. Ela, a felicidade, se afastou logo dali.
Ficou,
assim, pairando no ar, sem uma pessoa
onde morar. Acho que ainda está lá, mas, um dia, ela vai embora. Daí, então, se
alguém dela precisar, vai ter de fazer um requerimento oficial, com firma
reconhecida e nem cópia autenticada vai servir. Então é só esperar. Se for
aprovado, depois de muito tempo, quem sabe, ela poderá voltar. E irá, então,
para sempre, dentro de uma boa alma morar!
<><><><><><><><><><><><><>
À procura de Lucas (Flávio Cruz)
No comments:
Post a Comment