Aproximava-se
o final do século vinte e um. Laura, uma jovem engenheira de softwares do
governo americano, morava numa casa nos arredores de Richmond, Virginia. A
maioria das residências dessa época, além de extremamente confortável, era
também autossuficiente. Uma mini central de energia atômica cuidava de tudo.
Nada de depender de redes ou de serviços. O lixo, por exemplo, era
completamente destruído e pulverizado. A água apenas precisava ser reposta de
vez em quando pois era quase 100% reciclável. Com um robô ou mais cuidando
do resto, aquela era a residência dos sonhos.
Ultimamente,
entretanto, Laura passara a ter alguns problemas. Acordava às vezes com
barulhos estranhos bem no meio da noite. Outras vezes, durante o dia, via
pequenos segmentos de luz, como raios laser, passando a sua frente. Esses
eventos eram seguidos por sons que pareciam diálogos de pessoas ao longe, às
vezes pequenas sequências de músicas antigas, interrompidas outras vezes
por mais diálogos ou por ruídos de objetos caindo. Era como se existisse um
outro ambiente, com pessoas e tudo, usando o mesmo espaço. Incomodava tanto que
pediu uma inspeção oficial. Primeiro foi feita uma remotamente. Nada foi
encontrado e por isso uma inspeção local fez-se necessária. Nada, de novo. E os
eventos continuaram com algumas alterações. Basicamente, o que Laura sentia era
que havia dois ambientes superpostos.
Como ela
era funcionária do governo federal – agora chamado de governo central – tinha
acesso a arquivos que uma pessoa normal não tinha. Consultou primeiro o óbvio:
o que havia nos arredores. Talvez alguma instalação especial do governo ou de
alguma empresa que tivesse contratos com o mesmo. Nada. Depois leu sobre a
história do local. Foi aí que achou alguns arquivos que exigiam uma senha especial.
Tentou sua senha de funcionária classe B e funcionou. Exatamente naquele
quarteirão, havia há quarenta anos atrás, uma instalação do DARPA (Agência de
Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa). Faziam experimentos relacionados a
física quântica, principalmente tentativas de aplicação prática para grandes descobertas
na área por volta do ano 2050. O projeto havia sido cancelado pelo governo em
2055. Aparentemente algo tinha dado errado e em grande escala. Olhou então os
noticiários da época. Aparentemente 12 cientistas haviam morrido num “acidente”
dentro das instalações. Havia boatos sobre um projeto secreto de uma “máquina
de viajar no tempo” e outras coisas semelhantes. O diretor do DARPA negara
enfaticamente tudo, inclusive as mortes. A verdade é que o prédio foi
completamente demolido inclusive em sua parte subterrânea. Ficou uma área
isolada por 32 anos até que recentemente uma empresa construiu os modernos
conjuntos residenciais onde Laura tinha vindo morar.
Laura
queria saber mais, pois intuitivamente sentia que o que estava acontecendo
tinha relação com aquele projeto do governo. No entanto, sua solicitação para
ter acesso a arquivos específicos sobre o projeto foi negada. Alguns dias
depois recebeu um aviso oficial de que seria removida para uma unidade
residencial equivalente a algumas milhas dali. Logo depois ficou sabendo que o
quarteirão inteiro havia recebido a mesma notificação.
Laura
tentou descobrir mais coisas dentro do arquivo que já tinha consultado antes.
Talvez algum detalhe ou alguma informação tivesse passado despercebida. Para
sua surpresa, até mesmos esses arquivos normais não estavam mais lá. Tudo desaparecera como
num passe de mágica. No meio de tanta pesquisa, acabou deparando com o assunto
“casas mal- assombradas”, idiotices dos séculos dezenove e vinte. Leu alguns
arquivos e riu por dentro da ingenuidade daqueles povos antigos.
Afinal, o
mundo evoluíra tanto... Nesta alvorada do mundo ultramoderno, se assombrações
havia, pelo menos eram “assombrações quânticas” ...
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À procura de Lucas (Flávio Cruz)
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