Doce
Amargura, Perus 1963
Era
o ano de 1963. As crianças e os
adolescentes, de férias, andavam frenéticos pelas ruas, jogavam bola e faziam
outras coisas que nessa idade se costuma fazer. Uns cresceram e ainda estão em Perus,
outros morreram ou se mudaram, e uns poucos se perderam na vida. Naquele dia,
perdido no tempo e quase esmaecido na memória, eu estava em casa. Não porque
não quisesse sair, mas porque primeiro tinha de fazer umas tarefas. A Dona
Eleta, apesar de incansável, precisava de ajuda naquela manhã. No radinho - uma
caixa de madeira envernizada - o Moacir Franco cantava “Doce Amargura”. E ele
dizia que “Tudo é maldade, o mundo é mau”, falava de saudades, de distância, de
amargura. Falava também de inferno e paraíso. Eu não sabia de nada disso. A
vida, então, era bonita para mim.
Desconhecia
as tragédias passadas, como a Guerra Mundial que tinha acabado uns anos antes
de eu nascer. Mal sabia da Guerra do Vietnam e de outras barbaridades que
estavam acontecendo naquela época. Vagamente, tinha ouvido falar da bomba
atômica e da Guerra Fria. Nem imaginava que outras tragédias ainda aconteceriam
em nossa própria terra e em outras terras do mundo, num futuro próximo e
distante também. Tudo que eu queria, era sair e me divertir lá fora.
Ainda
bem que foi assim. Havia tantas desgraças que todos nós teríamos de enfrentar
um dia como adultos, que, aquele momento, como todos da nossa meninice e de
nossa juventude, era uma joia preciosa que precisava ser guardada. É por isso
que eu não entendia - ou não queria entender - a amargura da canção do Moacir,
nem mesmo sendo “doce”. A vida, naquele
exato momento, estava sendo como um néctar, e eu não queria misturá-lo com a
amargura. Não é isso que devemos fazer? Para que antecipar a tristeza? De um
jeito ou de outro, o sabor amargo da vida vai mesmo, um dia, inexorável, bater
à nossa porta.
oooooOOO0OOOooooo
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