A
moça do penúltimo vagão
O
subúrbio que a gente pegava na volta nem parecia o mesmo. De manhã, aquela
confusão, aquele aperto. No final da noite, era tudo melhor. Depois da última
aula, a gente corria e entrava no penúltimo vagão. Cada um tinha seu lugar
certo, eram no máximo vinte pessoas no carro inteiro. Ninguém mudava de posição.
Em turminhas de dois ou três, conversávamos, cansados, sobre o dia que tínhamos
tido.
Saíamos
da Estação da Luz e quando chegava a Barra Funda, entrava mais uma turminha. Na
Água Branca, de novo, outro grupinho, geralmente de estudantes, e cada um pegava seu lugar. Só que essa turma
era especial, pois a ela pertencia uma moça, magra, bonita e toda ajeitada. Longos
cabelos negros e lisos iam repousar, suaves e sedosos, sobre a blusa fina. Sentava-se
sozinha sempre no mesmo banco. Com delicadeza e classe colocava o fichário no
colo e olhava para o ar. Isso porque não queria, nós sabíamos, que nós
pensássemos que ela estivesse olhando para alguém. Ela sabia, porém, que todos
olhávamos para ela e todos nós sabíamos que ela fingia não saber. Era uma graça, era a
garota do trem. Delicada, suave e fina. Todo mundo suspirava, fingia que não
olhava, mas olhando todo mundo estava.
Eram
dois ou três minutos de silêncio, ninguém conversava. Com o canto dos olhos,
todos tentavam ver se naquela noite havia algo diferente, mas nunca havia. Era
ela, sempre graciosa, sempre fina e elegante. Daí chegava a estação da Lapa.
Era quando o namorado dela entrava e a graça acabava. Todo mundo voltava a
conversar, fazendo de conta que tudo estava normal...e estava. Finalmente, todos
chegávamos e descíamos na mesma estação: Perus. Ela, abraçadinha com o namorado,
seguia para casa. Nós também, seguíamos sozinhos para as nossas, sonhando com a
moça e esperando a próxima noite chegar...
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