Monday, August 18, 2014

A mulher que controlava

A mulher que controlava

Ela controlava tudo. A casa, os negócios do marido e, principalmente, o próprio marido. Coitado do Amarildo, em nada podia opinar. Todo mundo já estava acostumado. Ela mandava, todos obedeciam. Mandava fazer, era feito. Mandava desfazer, era desfeito. Feito um espião, passava um olhar certeiro por todo lugar. Fazia, desfazia, mandava fazer de novo, para depois dizer que ainda não estava bom. O Amarildo não era nada. Se tentasse ser alguma coisa, num instante ela o faria desistir.
Não sei se foi por isso, se por outras coisas mais, um dia ele teve um ataque do coração. Talvez fosse coincidência, ele já tivesse um problema assim. Aquela coisa toda: choradeira, funeral, enterro. E todo mundo se esqueceu rapidamente do Amarildo. De qualquer jeito, quando vivo, já ninguém se lembrava mais do coitado. Ironicamente, quem mais sentiu a falta, foi ela. Não tinha mais em quem mandar. Nem quem controlar.  Foi sentindo um vazio enorme, uma falta de graça pela vida. Até comentaram, está vendo, ela era assim, mas amava o marido.
Nada disso, posso garantir. Ela amava era o seu jeito de mandar e o jeito do Amarildo obedecer. Tem gente que é assim.

Pois é, a festa acabou, não há mais nada, nem mais ninguém para controlar, nem ser controlado.

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Essa vida da gente

(crônicas e contos sobre o cotidiano)







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