Friday, August 8, 2014

Nestes termos pede deferimento


Nestes termos pede deferimento

Gumercindo era uma espécie de auxiliar de despachante. Quase todo dia vinha para a repartição resolver algum assunto. E era a melhor parte do dia, apesar do que possa parecer. Lá ele podia ver a linda moça do guichê. Aquela morena clara, cabelos curtos, sorriso de marfim, era de arrebentar seu coração. Aquela fila era para atender apenas aos diretamente interessados, nada de intermediários. Se assim não fosse, lá estaria ele todos os dias esperando para ser atendido.
Ela estava sempre muito ocupada. Sua vontade de falar com ela era tanto, porém, que ele botou sua imaginação para funcionar. Afinal de contas, ele entendia daquilo, sabia de que tipo de assunto o pessoal ia ali tratar. Fez um requerimento, só para poder ir falar com ela:

Ao Instituto de  Assistência a Pessoas Apaixonadas

Gumercindo Augusto dos Anjos, brasileiro, desesperado, residente à Rua da Carência s/n, vem, respeitosamente, diante de sua presença para pedir atenção. Seu coração, ultimamente, tem palpitado muito mais do que o normal. A causa é, sem dúvida, a  presença de uma formosa donzela neste recinto. Ao  ver seu rosto lindo, mal pode se conter. Espera que, diante deste seu pedido, a sua pessoa olhe para este coração ferido. Anexa, para sua apreciação, a cópia de uma alma despedaçada pela desesperança de não poder lhe falar.       

                                                             Nestes Termos,
                                                            Pede Deferimento
                                                                                                                                                                                                              Gum ercindo Augusto dos Anjos


No dia seguinte, lá estava ele, todo ansioso, requerimento na mão, esperando para ser atendido. A fila estava comprida, mas finalmente chegou sua vez. Olhou bem para o rosto dela, deu um suspiro e estendeu o papel. Ela leu rapidamente  o texto e respondeu, quase sem piscar:
- O senhor precisa reconhecer firma. E já que disse que está anexando um documento, ele precisa estar aqui, em anexo, como a própria palavra diz. E a cópia precisa ser autenticada, por favor. Próximo!
Gumercindo mal podia crer no que tinha acabado de ouvir. Ela nem tinha lido o seu lindo texto. Não se importou com a presença dele, ali, se consumindo em paixão. Abaixou a cabeça e murmurou para si mesmo:
-Burocrata fria, gélida. 
E completou: "Maldita a burocracia!"

E foi triste para casa, pensando em arrumar um novo amor.

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