Lágrimas
de presidente
Para muitos que não vivem nos Estados Unidos, o presidente
Obama é de direita, pelo simples fato de ser um presidente americano. Dentro
desse país, no entanto, ele é considerado de esquerda. Um socialista, quase
comunista. E todo mundo sabe que “socialismo” é um verdadeiro palavrão por
aqui. Esse negócio de esquerda ou direita é daquelas coisas extremamente
relativas, como quase tudo na vida.
Pois bem, esse presidente, que paradoxalmente está ao mesmo
tempo nas duas pontas do longo palco político, chorou há algumas semanas atrás.
E não pensem que foi na intimidade de sua sala na Casa Branca. Não, senhor, foi
ali na frente de todo mundo, em rede nacional de televisão. Ele estava tentando
defender algo que parece lógico num mundo supostamente lógico: fazer com que as pessoas que
querem comprar armas tenham um atestado de antecedentes criminais. Já tentou
isso antes e foi derrotado no Congresso. O pessoal que gosta das armas - quase todo mundo - não quer que ninguém sequer
chegue perto de qualquer controle. Mas voltemos ao choro. Foram lágrimas reais,
até grossas, e rolaram copiosas pelo rosto do mandatário.
Gritaria geral do pessoal que defende armas para todos.
Lágrimas de crocodilo, fingidas, uma encenação. Eu já vi choro fingido, posso
garantir que aquelas lágrimas eram as mais sinceras que um homem pode verter. O
motivo do choro? As crianças que morreram no massacre da Sandy Hook Elementary
School. Bastante compreensível para um pai que tem duas filhas. Eu não sou
autoridade em lágrimas presidenciais, mas apostaria um milhão – que nunca tive
e jamais terei – na autenticidade delas.
Cheguei a pensar em pedir para minha querida nora, a Mirella, que é atriz, para
dar uma olhada no tape. Tenho certeza de que ela concordaria comigo.
Esse povo não acredita que um presidente possa chorar por
um verdadeiro motivo: vinte crianças que morreram de uma forma estúpida.
Sou suspeito por apoiar o Obama. Sempre achei que ele está
sendo o melhor presidente das últimas décadas. Tudo que enfrentou, as causas
pelas quais lutou, o respeito e dignidade que teve com seus adversários, só vai
ser apreciado muito tarde.
As lágrimas do presidente, posso garantir mais uma vez, são
as coisas mais legítimas que vi nos últimos tempos.
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